Arquivo do Autor: Gilberto Maluf

O lado folclórico de Manga, por Sandro Moreira

Clubes que atuou
Sport Recife (1957/1958), Botafogo (1958 a 1967), Nacional de Montevidéu (1968 a 1973), Inter de Porto Alegre (1974 a 1976), Coritiba (1977/1978), Grêmio (1978/1979), Operário (1979) e Barcelona de Guayaquil (1982)

Principais títulos
Nacional de Montevidéu : Taça Libertadores e o Mundial Interclubes, em 1971, Inter: Bi-campeão brasileiro (1975/1976),Coritiba : Campeão paranaense em 1978 e campeão gaúcho pelo Grêmio em 1979.

Posição
Goleiro
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Feio, com a cara toda marcada pela varíola, Aílton Correia Arruda só poderia mesmo ter o apelido de Manga. Pernambucano revelado pelo Sport, consagrou-se no Botafogo. Foi um dos maiores fenômenos da posição na história do futebol brasileiro. Arrojado, elástico, autor de defesas impossíveis, tinha quase todos os dedos da mão quebrados. Aliás, mal fechava a mão.
O folclórico Manguinha, de tantas histórias , adorava provocar a torcida do Flamengo. Ás vésperas de clássicos diante do rubro-negro, avisava que já gastara o bicho antecipado.
Manga foi um dos jogadores a sucumbir no fiasco da seleção na Copa de 66, ao falhar muito na derrota por 3 a 1 para Portugal.
Num jogo pela seleção, antes disso, por sinal, cobrou um tiro de meta e a bola bateu na cabeça do russo Metreveli, voltando para dentro do gol e empatando o amistoso por 2 a 2.
Na comemoração pelo título carioca de 67, foi acusado por João Saldanha de estar na gaveta do Bangu. Manga, que atuara mal naquela partida, teve de sair correndo do furioso comentarista, e ex-técnico, e, dizem, pulou um muro de três metros de altura da sede do Clube.
Desgastado, foi negociado no ano seguinte com o Nacional de Montevidéu, onde brilhou por seis anos e foi ídolo da torcida. Retornou ao Brasil em 74, para defender o Internacional, e, pelo time gaúcho, foi campeão estatual em 74, 75 e 76 e bicampeão brasileiro em 75/76. Em 77, aos 40 anos, foi convocado para a seleção brasileira, pelo técnico Cláudio Coutinho. Mas ficou na reserva de Leão. Passou ainda pelo Operário-MS, Coritiba e Grêmio e encerrou a carreira no Equador, onde se radicou.

FOLCLORE
Aconteceu na Concentração:
Na concentração do Botafogo, a tarde era chuvosa. O jeito de combater o tédio era jogar conversa fora. De repente, não se sabe como nem por que, surgiu um papo sobre hierarquia.
Conversa vai, conversa vem, Didi, na discussão, quis saber do folclórico goleiro Manga se ele realmente sabia o que era hierarquia.
– Sei sim, negão! – rebateu Manguinha. – Hierarquia é aquilo que só dirigente grande faz, como pagar a conta do hotel e tomar conta da mala de dinheiro.

Salvo pelo gongo:
Contava o saudoso jornalista Sandro Moreira, que o goleiro Manga estava sentado ao lado da esposa do presidente do seu clube, totalmente deslocado. Não sendo homem de freqüentar reuniões sociais e muito menos de conversas com senhoras finas, estava encabuladíssimo e sem assunto. Angustiado, buscava conversa, quando viu no fundo de um corredor uma mesa de bilhar. Era a sua tábua de salvação. Manga se encheu de coragem, estufou o peito e, muito sério, perguntou à madame: Por acaso a madame joga sinuca ? Não, horrorizou-se a dama. Então leva 40 pontos. Vamos lá ?

Goleiro Comentarista:
O lendário goleiro Manga, já aposentado, foi convidado para ser comentarista, de uma rádio, em uma partida entre dois times amadores. Convite aceito, lá estava Manga na pequena cabine pronto para o jogo. Estádio cheio, não pelo valor da partida, mas simplesmente pela presença do goleiro. Após 5 minutos de jogo, o narrador pergunta: -“Manga, como você está vendo o jogo ?”. Manga responde:-“Com os olhos, com os olhos!”.

Estádios que não existem mais

Para conhecimento e para quem viu e é saudosista, vejam alguns estádios que não mais existem pelo Brasil afora:

Estádio da Floresta

O Estádio da Floresta foi um dos primeiros palcos onde se jogou futebol em São Paulo. Situado junto à Ponte das Bandeiras, às margens do rio Tietê, ficava em uma chácara. Serviu inicialmente como casa da Associação Atlética das Palmeiras após ser adquirido ao Clube de Regatas São Paulo. Mas com a extinção do clube, passou a ser utilizado pelo São Paulo da Floresta. Dados históricos apontam que o embrião do São Paulo Futebol Clube jogou neste local 71 vezes com 52 vitórias, 14 empates e apenas cinco derrotas.
Tinha capacidade para 10 mil pessoas. Hoje, ainda existe dentro do Clube de Regatas Tietê, bem distante de sua fisionomia original.

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Vejam o Corinthians posando para foto no lendário e saudoso estádio da Chácara da Floresta. Foto: arquivo do Corinthians

Estádio de General Severiano

Não se pode contar a história do Botafogo sem passar pelo estádio de General Severiano. Em 1913, no dia 13 de maio, o alvinegro disputou pela primeira vez um jogo no local justamente contra o Flamengo. Venceu por 1 a 0 com gol de Mimi. Naquela ocasião, as equipes atuaram da seguinte forma:
Botafogo: Álvaro Werneck, Edgard Dutra e Edgard Pullen; Pino, Rolando de Lamare e Juca Couto; Villaça, Abelardo de Lamare, Facchine, Mimi Sodré e Lauro Sodré
Flamengo: Casusa, Píndaro e Nery; Gallo, Amarante “Zalacain” e Lawrence; Orlando ‘Bahiano’, Alberto Borgerth, Figueira “Joca”, Dell Nero e Raul de Carvalho
Vinte e quatro anos depois, o estádio passou por reformas e ganhou arquibancadas de cimento. Foi reinaugurado com uma partida em que o Fogão bateu o Fluminense por 3 a 2. Em 1948, diante de 20 mil pessoas, o time da estrela solitária ganhou em sua lendáruia casa o Campeonato Carioca ao bater o Vasco por 3 a 1.
No entanto, na década de 1970, o Botafogo perdeu a posse de General Severiano, o que gerou a demolição de parte de sua estrutura. Em 1990, o terreno foi recomprado. No local, hoje existe uma ótima infra-estrutura com campos de treinamento, concentração, ginásio e piscinas.

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Estádio de General Severiano na década de 1930 já com arquibancadas de cimento

Estádio do Andaraí, do América do Rio

O estádio Wolney Braune, no bairro do Andaraí, no Rio de Janeiro, foi utilizado pelo América a partir da década de 1960. Em 1961, o clube adquiriu a praça de esportes junto ao Andaraí com dinheiro recebido pela venda do volante Amaro para a Juventus de Turim, jogador que, quando retornou ao Brasil, defendeu o Corinthians. Em 1993, o terreno onde situava-se o Andaraí foi vendido a uma empresa que, no local, construiu o Shopping Iguatemi. Com o cofre cheio, o América encontrou fôlego para construir um novo estádio em Édson Passos, onde manda seus jogos atualmente.
No dia 20 de janeiro de 1977, quando a cidade do Rio de Janeiro comemorou mais um aniversário, o América reinaugurou o estádio do Andaraí com novos lances de arquibancadas em um jogo amistoso contra o Palmeiras. A partida, curiosamente, não terminou, já que após as expulsões de Vasconcelos, Jorge Mendonça e Toninho, Rosemiro e Samuel simularam contusões e o Palmeiras ficou sem condições legais de prosseguir em campo. Até então, o time carioca vencia por 1 a 0 com um gol de pênalti marcado por Bráulio.
Abaixo, a ficha técnica desta partida.

AMÉRICA 1 X 0 PALMEIRAS
Local: Estádio Wolney Braune, no Andaraí.
Público pagante: 4.129
Juiz: Luís Carlos Félix
Auxiliares: Roberto Costa e Mário Leite Santos.
Gol: Bráulio de pênalti aos 24 minutos do primeiro tempo.
Substituições: no América, César no lugar de Ailton.
Ocorrências: cartão amarelo para Samuel e vermelho para Jorge Mendonça, Vasconcellos e Toninho (todos do Palmeiras)
América: País, Uchoa, Alex, Biluca e Álvaro; Renato, Bráulio e Gilson Nunes; Reinaldo, Lincoln e Ailton.
Palmeiras: Fernandinho, Rosemiro, Samuel, Jair Gonçalves e Zeca; Ivo, Jorge Mendonça e Vasconcelos; Edu, Toninho e Nei.

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O estádio do Andaraí lotado em dia de jogo do América. Em 1993, o terreno onde estava localizado foi vendido e, no local, construído um shopping center. Fonte: site do América

Estádio dos Eucaliptos

O antigo estádio dos Eucaliptos, do Sport Club Internacional, de Porto Alegre, foi a casa colorada até a inauguração do Beira Rio, em 06 de abril de 1969. Sua história começou a ser contada em 1931 em um Gre-Nal, vencido pelo Inter por 3 a 0. Tinha capacidade para 10 mil lugares. Javel marcou os três gols do encontro, apitado por Heitor Deste. O Inter jogou com Penha; Miro e Risada; Ribeiro, Magno e Moreno; Nenê, Javel, Ross, Honório e Ricardo. O Grêmio com Lara; Sardinha I e Sardinha II; Dario, Luiz Carvalho e Russo; Domingos, Artigas, Foguinho, Corô e Nenê. Em 1950, sediou duas partidas da Copa do Mundo do Brasil: Suiça e México e México e Iugoslávia.
Em março de 1969, dias antes da inauguração do Beira Rio, o estádio recebeu sua última partida. O Inter bateu o Rio Grande por 4 a 1. Tesourinha, um dos maiores ídolos do clube, entrou em campo mesmo com 48 anos nos minutos finais e, ao apito do árbitro, arrancou uma das redes para guardar de recordação.
Em 2007, o Inter tentava negociar o terreno onde situa-se o estádio. O preço mínimo: R$ 20 milhões. No local, existem quadras de futebol com grama sintética para aluguel.

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Imagem aérea do estádio dos Eucaliptos, casa colorada até a inauguração do Beira Rio. Fonte: site do Internacional

Estádio Joaquim Américo, do Atlético Paranaense, antes de ser demolido para a construção da Arena da Baixada

Quem assiste a jogos na Arena da Baixada, pertencente ao Atlético Paranaense, sente-se em um templo do futebol com ares europeus. Com capacidade para 32 mil pessoas sentadas, o estádio, cujo nome é Joaquim Américo, é uma referência sul-americana de modernidade. No entanto, até 1997, existia no local um outro estádio com capacidade inferior e com o mesmo nome. Obra idealizada por Joaquim Américo em 1914, quando ocupava a presidência do Internacional, um dos clubes que originou o rubro-negro. Ao ser fundado em 1924, o Atlético herdou este patrimônio e, anos depois, batizou o estádio com seu nome.
Em 1994, a diretoria do clube realizou melhorias no local que duraram apenas três anos já que, em 1997, decidiu-se pela demolição do estádio. Assim surgiu a Arena da Baixada, construída em apenas dois anos.
Na época, cartolas atleticanos decidiram utilizar o modelo europeu conhecido como arena, com capacidade para sediar não apenas jogos de futebol mas também espetáculos, além de oferecer vários serviços como restaurantes e estacionamento.
O novo estádio foi inaugurado em 24 de junho de 1999 com o jogo entre Clube Atlético Paranaense e Cerro Porteño do Paraguai.

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Estádio Joaquim Américo antes da demolição. Palco de grandes jogos do Atlético até 1997, deu lugar à maravilhosa Arena da Baixada. Fonte: Site do Atlético

Estádio Mário Alves de Mendonça

Cartaz exposto nas ruas de Rio Preto em 1948 anuncia a partida inaugural do estádio Mário Alves de Mendonça entre o América local e o América do Rio de Janeiro. Cita, inclusive, que o time carioca havia acabado de regressar invicto de uma excursão por Colômbia e Equador. Fonte: site do América
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Inaugurado em 27 de junho de 1948 na partida em que o América de Rio Preto empatou por 1 a 1 com o América do Rio, o estádio Mário Alves de Mendonça serviu de palco para o América paulista até 1996. A partir de então, o Diabo passou a mandar seus jogos no estádio Benedito Teixeira, bem maior e mais moderno. Sem ser utilizado, o Mário Alves de Mendonça foi demolido para a construção, no mesmo local, de um grande supermercado.
O gramado da antiga praça de esportes tinha 110 metros de cumprimento por 78 de largura. As arquibancadas, capacidade para 20 mil pessoas. Foi construído em três meses para o clube jogar na segunda divisão paulista.
Inicialmente, o campo era de terra batida, sem grama, e podia receber apenas três mil pessoas. Em 1957, a capacidade foi ampliada.
O maior público do estádio aconteceu em 1979, quando 23.800 pessoas acompanharam o empate sem gols entre América e Corinthians pelo Campeonato Paulista.

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O antigo estádio serviu de palco para o América até 1996. Tinha capacidade para mais de 20 mil pessoas

Nei, o craque bossa nova

Nei, antigo centro avante do Corinthians dos anos 60, formou duplas com Silva, Geraldo II, Airton e no final com Flavio Minuano. Era considerado a ” menina dos olhos de Wadih Helu “, e a grande revelação do futebol paulista. Chegaram ao exagero de compará-lo a Pelé.
Começou a jogar no Corinthians em 1962. Foi capa da Revista do Esporte . Ao ver a revista na banca tive que sacrificar todo o dinheiro que tinha no bolso para comprar a revista. Eu tinha 11 anos.
Quem é daquela época gastava dinheiro em Gibi, Revista do Esporte, Figurinha, Doces e Matinê de cinema.
Como o time do Corinthians tinha por adversários verdadeiras máquinas de jogar bola, o Santos e Palmeiras, era muita pressão em cima do Nei.
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Por volta de 1965 rumou para o Rio de Janeiro onde defendeu o Flamengo, jogando ao lado de Doval , Fio, Rodrigues Neto e Caldeira.
Fez também sucesso no ataque do Vasco da Gama ao lado de Nado, Danilo Menezes, Bianchini e Silvinho. Não consigo lembrar do Nei no Botafogo.
Eu presenciei uma jogada do Nei no Parque São Jorge que é difícil de acreditar nos tempos de hoje.
Nei estava em má fase e estava jogando a preliminar do Corinthians pelos aspirantes. Nas antigas sociais do Parque São Jorge o Nei foi aplaudido de pé pelos conselheiros e diretores. Deu uma voadora na bola perto da bandeira de escanteio e a bola veio pelo alto em direção ao gol e entrou. Foi um misto de bicicleta/voleio. Nunca mais vi. Ele era excessivamente técnico.
Craques de refinada técnica como ele e Almir Pernambuquinho foram muito cobrados. As vezes o exagero nos elogios e nas cobranças fazem sucumbir o jogador, uns mais , outros menos.
No Rio de Janeiro escutei uma narração de um gol de Nei onde o locutor chamava-o de Nei, o craque bossa nova
Gilberto Maluf

O Jabaquara do goleiro Dudízio

O goleiro Dudízio chegou ao Jabaquara de Santos em 1961 para ser o reserva de Barbosinha, mas, na primeira chance que teve de substituir o goleiro titular, não deixou mais a posição.
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Em 1962, foi eleito terceiro melhor goleiro do campeonato paulista pela Rádio Difusora, atrás apenas de Gilmar e Félix, isso apesar de seu time ter sofrido 72 gols ao longo do campeonato, ficando com a segunda pior defesa. No mesmo ano, foi eleito ainda o melhor goleiro jovem da competição, em votação da agência Sport Press publicada pela Folha da Manhã. Também foi convocado para defender a seleção paulista na disputa do Campeonato Brasileiro de Seleções de 1962.

Essa aparente incongruência fica mais clara quando se lê artigos de jornal da época. Em uma partida perdida para o Santos por 5×2, em 19 de agosto, por exemplo, um jornal do dia seguinte destacava que “Dudízio, apesar de ter sofrido cinco gols, foi um dos bons valores do Jabaquara”. Outro elogiou ainda mais a atuação do goleiro, elegendo-o à seleção da rodada, apesar dos cinco tentos sofridos: “Dudízio jogou uma extraordinária partida contra o Santos. Não fora ele, e o Jabuca teria perdido por dez. Até penalidade máxima defendeu! Maior arqueiro da rodada, com belíssima atuação.” Essa penalidade máxima foi cobrada por Pepe, conhecido como “Canhão da Vila”. Dudízio foi um dos poucos goleiros a defender um pênalti cobrado por Pepe.

Em outra derrota, por 3×1, para o São Paulo, em 28 de outubro, um jornal do dia seguinte estampava: “Dudízio apareceu como a melhor figura da sua equipe, evitando uma contagem maior.”

Após uma derrota por 1×0 para o Juventus, na Rua Javari, em 11 de novembro, a Gazeta Esportiva do dia seguinte foi eloqüente: “O desenvolvimento do encontro girou praticamente em torno de dois jogadores: Dudízio e Da Silva. O juventino organizou com eficiência e dinamismo os movimentos do seu ataque, que implicaram no domínio total exercido pelo quadro local. O arqueiro jabaquarense Dudízio, por sua vez, foi o obstáculo mais sério que o Juventus enfrentou, notadamente no primeiro tempo, quando a pressão dos grenás foi mais acentuada. Dudízio teve atuação impecável e encarregou-se repetidas vezes de anular, com oportunas defesas, a conclusão do trabalho que o meia juventino Da Silva pacientemente executou no meio do campo.”

O site de Milton Neves chega a brincar com esse assunto: “[Dudízio] deve ter sido o goleiro mais vazado da história. Mas ele era muito bom. O time do Jabaquara é que era muito ruim.” Não parecem ser exageradas as histórias que dão conta de que, ao final de 1962, o Jabaquara tenha recebido propostas das quatro grandes equipes de São Paulo pelo seu passe.

Em 1963, as boas atuações continuaram. O Diário da Noite, em sua edição de 29 de julho, escreveu: “Gilmar, Antônio Lima dos Santos, Pelé, Cabrita, Rubens Salles e Dudízio foram os melhores valores do encontro.” Detalhe: a partida terminou 5×2 para o Santos.

Em um amistoso contra a Portuguesa Santista, então na divisão de acesso, no mesmo ano (derrota por 2×0), a Gazeta Esportiva advertia que o Jabaquara caminhava perigosamente rumo ao rebaixamento. Mas destacava: “Não fora a atuação de Dudízio, trabalhando por si e pelos outros, às vezes, e possivelmente o escore teria ido além, mostrando que a situação do tradicional rubro-amarelo é por demais precária no momento.”

O rebaixamento de fato ocorreu, com o Jabaquara na lanterna do campeonato e dono da defesa mais vazada (mais de 20 gols sofridos a mais que a segunda defesa mais vazada), mas, ainda assim, Dudízio foi eleito o quarto melhor goleiro do campeonato pelo jornal Mundo Esportivo, atrás de Gilmar, Rosan e Machado. O Jornal Mundo Esportivo era de Geraldo Bretas, polêmico jornalista.

O mesmo jornal fez em outra edição durante o torneio, após um empate em 1×1 com o Corinthians em 16 de junho, uma das referências mais elogiosas a Dudízio: “O homem deu um ‘show’, mostrando como se joga de fato nessa posição. Classe, categoria, arrojo, extraordinário golpe de vista, colocação impecável debaixo das traves, segurança, perfeito preparo físico, elasticidade etc. etc. foram as características de Dudízio. Quando alguém do Corinthians pensava em gol, desanimava-se, porque pela frente teria este goleiro, o melhor homem da partida. Nenhum goleiro jogou neste campeonato, até o presente momento, como o jabaquarense, que merece um quadro de honra especial: o de homens com belas atuações .
Em jogo contra o São Paulo, em 8 de setembro, o jornal Equipe , de propriedade do jornalista Wilson Brasil, avaliou a atuação de Dudízio da seguinte maneira: “Dudízio praticou pelo menos meia dúzia de intervenções espetacularíssimas, que salvaram sua equipe de uma ‘goleada’. Em excepcional forma, com enorme elasticidade, foi sempre um ‘não’ às pretensões tricolores.”

No final da temporada, recebeu proposta do Santos, por meio do técnico Lula, para substituir o goleiro reserva da equipe, mas as negociações, que chegaram a ficar adiantadas, acabaram não sendo concretizadas.

Até hoje, Dudízio é considerado com um dos grandes ícones da história do Jabaquara. Sobre a época em que defendeu o Jabaquara, costumava contar histórias sobre as “peladas” na praia, às segundas-feiras, em que teria jogado junto com Pelé.

Em 1963, o velho Jabuca de Dudízio estava na última colocação, com 33 pontos perdidos e, para piorar, perdeu os três jogos seguintes. Todos diziam que era o fim de tudo.

O Jabaquara enfrentou o Juventus, na Vila, e mesmo com uma apresentação razoável conseguiu empatar por um gol. Uma vitória bonita contra o XV de Piracicaba, por 3×1, deixou os jabaquarenses em festa. E alegria ainda maior, venceu a Portuguesa de Desportos pelo mesmo resultado. Faltavam apenas dois jogos para encerrar o campeonato e, se o Leão vencesse as duas partidas, teria oportunidade de disputar com a Prudentina, penúltima colocada, o chamado rebolo.

Um dos adversários seria o Santos. Exatamente a 11 de dezembro de 1963, estavam alinhados no gramado da Vila Belmiro, o Jabaquara e o Santos. O último, com uma posição privilegiada na tabela, podia perder. Neste jogo pediram para um jogador do Santos bater o pênalti fora, para salvar o Jabuca. Mas isso não aconteceu e o Santos arrasou o Leão do Macuco numa goleada histórica de 5 a 3.

Olhos vermelhos, lenço na mão, os torcedores olhavam o placar. Ninguém comentava os lances, ninguém falava do primeiro gol do Coutinho. Alguns diziam que o Santos poderia ter entregue o jogo. Outros achavam que o Santos não ganhou, o Jabaquara perdeu.
Era o fim de um trabalho gigantesco: o Jabaquara de Dudízio caiu para a 2ª Divisão.

Wikipedia
Diário do Comércio, 20/09/2004, pág. Esportes-1
Gazeta Esportiva, 12/11/1962
http://www.miltonneves.com.br
Diário da Noite, 29/07/1963
Mundo Esportivo, 13/11/1963
Equipe, 11/09/1963
O Estado de S. Paulo, 07/12/1963
Carlos Augusto Colussi, “Dudízio: uma fera entre dois leões”, A Tribuna, Santa Cruz das Palmeiras, janeiro de 2004

Omar Cardoso errou a previsão sobre quem seria o campeão paulista de 1963

Este artigo estava com título endereçado ao paraguaio Cecílio Martinez , antigo ponta do São Paulo Futebol Clube, que num sábado à noite virou um jogo em cima do Corinthians. Existem jogos que a gente nunca esquece, para alegria ou para tristeza. Mas Cecílio Martinez também induziu, de certa forma, Omar Cardoso ao erro na previsão ao comandar a vitória do São Paulo contra o Palmeiras. Li um relato contado pelo Mario Lopomo, historiador de futebol, no site SãoPaulominhacidade, que vai ilustrar sobremaneira o relato. Vamos a ele:
Nos Estados Unidos, ninguém saía de casa sem olhar o horóscopo. Como tudo que é bom para os Estados Unidos, é bom para o Brasil, pronto. Foi um tal de aparecer horoscopistas nas emissoras de rádio.
O mais famoso aqui no Brasil era Omar Cardoso. “Bom dia, mas bom dia mesmo!”, era o seu jargão inicial do programa. Muitas cartas ele recebia. A maior parte era de mulheres grávidas, que queriam saber se ia ter um menino ou menina.
Omar Cardoso perguntava: a senhora sabe quando ocorreu a concepção? Dependendo dos meses de gravidez, a senhora sabe o início da concepção.
Outra pergunta comum era: será que o filho(a) será feliz?
Omar Cardoso não perdia tempo, e já ia dizendo: diga a data do nascimento, a hora e se era ano bissexto. Dependendo da lua seu filho ou filha seria assim ou assado, dizia o grande Pitonizo dos anos 1960-70, falecido em 1978. E o povo acreditava piamente. Tinha gente que até brigava em favor do radialista.
Em 1963, por ocasião do Campeonato Paulista de Futebol, a disputa era ferrenha entre Palmeiras e São Paulo. O São Paulo estava na frente do Palmeiras em pontos perdidos, e no último jogo do primeiro turno o São Paulo ganhou por 3×1 numa jornada brilhante de um jogador paraguaio chamado Cecílio Martinez ( olha ele aí ).
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Foi o bastante para que um torcedor mandasse uma carta para Omar Cardoso perguntando quem seria o campeão paulista de 1963. Tinha ainda o segundo turno todo pela frente, e Omar Cardoso disse que não diria o nome, mas ele sabia de antemão quem seria o campeão paulista. “Vou dizer apenas as cores do clube. Meu caro ouvinte: o campeão paulista deste ano tem as cores Vermelha, Preta e Branca.”
O segundo turno começou. O Palmeiras achou que o técnico Geninho não estava bem, o mandou embora e contratou o Silvio Pirilo.
Logo no início do segundo turno em outubro, o Palmeiras goleou a Portuguesa de Desportos por 5×1. Foi a reestréia de Fiori Gigliotti, transmitindo jogos de futebol pea Rádio Bandeirantes. Pedro Luiz e Mario Moraes, estreavam na Rádio Tupi.
O campeonato transcorreu numa luta titânica, e o Palmeiras invicto no segundo turno, foi descontando, até que na penúltima rodada contra o Noroeste de Baurú, no Pacaembu, o Palmeiras se tornou campeão paulista, vencendo o jogo por 3×0. Uma faixa enorme apareceu no gramado: “Os astros não mentem jamais. Mas os verdadeiros astros estão na Sociedade Esportiva Palmeiras”.
Voltando agora somente ao Cecílio Martinez, ele fez parte daquele jogo contra o Santos na fatídica tarde que o Peixe fugiu de campo. Nesta tarde de 15 de agosto de 1963 nós fomos ao Pacaembu para ver o Santos de Pelé e vimos um São Paulo histórico. O ataque tricolor dos 4 x 1 era Faustino, Bene, Sabino, Pagão e Cecílio Martinez. Destes somente o paraguaio está vivo. Como jovem não guarda mágoa, fui com o torcedor santista que não me convidou para ver na TV a final de Botafogo x Flamengo de 1962, último grande jogo do Garrincha. Em 1962 nós estávamos com 11 anos de idade. Para quem não entende, o futebol era o atual video-game.
Mas este paraguaio Cecílio Martinez fez mais uma das suas.
Em 24 de abril de 1965, sábado à noite, com arbitragem de Olten Ayres de Abreu, jogaram Corinthians x São Paulo e eu estava lá. O centro avante Flávio fez 1 x 0 para o Corinthians aos 11 do 1° tempo. Parecia que ia dar Corinthians e aos 35 do segundo tempo saí do estádio para conseguir pegar o ônibus sem tumulto. Indo ao ponto de ônibus seguiam outros torcedores, alguns com rádinho de pilha.
Ouço o barulho de gol aos 39 do segundo tempo….Valter Zum Zum pontadireita do São Paulo empatou o jogo. E aos 41, dois minutos após, outro barulho de gol……Cecílio Matinez.
Para imaginar a minha moral, se passasse um cachorro na minha frente eu ia pedir licença pra ele.
O ponta paraguaio balançou as redes pelo tricolor 17 vezes, segundo o almanaque do São Paulo.
Gilberto Maluf

Dino Sani gastava o lado externo da chuteira

Meus amigos, vi Dino Sani jogar no Corinthians no Parque São Jorge, Pacaembu e Morumbi. Vi formar dupla de meio de campo, ao longo de três anos, com Luisinho, Rivelino e Nair. Tinha uma categoria acima da média. Quando ele tocava uma bola jamais batia de ” chapa ” , usava o peito do pé. Para quem batia de chapa como eu, comecei tentar imitar o Dino Sani. No começo espirrava bola pra tudo quanto é lado. Mas depois acaba pegando um pouco o jeito e começa a ficar estranho bater de chapa. Mas é muito mais difícil.
Outra coisa que enchia os olhos da gente era quando ele “matava” a bola no peito. A bola morria ali mesmo e quando descia aos pés com certeza seus passes tinham endereço certo. Mas o que dizer de quem recebi a bola? As vezes, quase sempre, quem recebia não tratava a pelota com o mesmo carinho.
A seguir um pequeno relato de sua carreira (GE Net) com algumas relíquias de fotos que ele gentilmente cedeu ao site do Milton Neves.
Gilberto Maluf

Clubes onde Dino jogou
1950-1951: Palmeiras-SP
1951: XV de Jaú-SP
1952-1953: Commercial-SP
1954-1959: São Paulo FC-SP
1959-1961: Boca Juniors – Argentina
1961-1964: Milano AC – Itália
1965-1968: Corinthians-SP

Títulos por equipe Campeonato Paulista: 1957
Copa do Mundo: 1958
Campeonato Italiano: 1963
Liga dos Campeões da Europa: 1963
Torneio Rio – São Paulo: 1966

Exceção feita ao Palmeiras, clube no qual começou a carreira, em 1950, Dino foi um dos jogadores de destaque em todas as equipes por que passou. No time do Parque Antártica, ainda muito jovem, não teve espaço em um elenco recheado de craques, como Humberto Tozzi. “Além dele, havia Valdemar Fiume, Aquiles, Lula, Rodrigues e Jair da Rosa Pinto”, lembra.

Com tantos bons jogadores, o Alviverde decidiu emprestar o atleta de 18 anos ao XV de Jaú.
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Confira Dino em sua época de XV de Jaú. Em pé: Lourenço, Clóvis, Servílio, Grita, Rui e Gengo. Agachados: ponta não identificado, Duílio, Américo Murolo, Dino Sani e Itamar.

Ele voltou no ano seguinte e foi vendido para o saudoso Comercial da Capital, onde passou duas temporadas. Sua classe e toque de bola não passaram despercebidos e, em fevereiro de 1954, era contratado pelo São Paulo.
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Esta foto – do então badalado profissional Viotti – também é sensacional e raríssima: Dino Sani no ataque do saudoso Comercial da capital! O primeiro em pé é Alan, que iria para o Corinthians, e Gino Orlando faz dupla de área com o então topetudo Dino Sani.

A missão no Tricolor era difícil: substituir José Carlos Bauer. Dino Sani, no entanto, a cumpriu com tranqüilidade. Ainda hoje, os torcedores mais velhos lembram do médio-volante como um dos melhores meio-campistas a vestir a camisa do clube do Morumbi. “Em 1957, ganhamos o Campeonato Paulista com um time fantástico”, recorda.
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Dino faz gol em Castilho no Maracanã. O lateral Cacá só olha e lamenta.

Desde a Copa da Suécia, Dino Sani e Milan curtiam um namoro que acabou virando casamento em 1961, quando ele se transferiu para a Europa. Lá, caiu no gosto da metade rubro-negra de Milão e conquistou o Campeonato Italiano de 1962 e o Europeu de 1962/63.

O sucesso do brasileiro foi tanto que, segundo ele, chegou a ser convidado para a disputar a Copa de 1962, no Chile, pela Itália. “Não aceitei. Sempre joguei sério e não conseguiria enfrentar o Brasil. Continuei pela Europa e tenho certeza que sempre consegui elevar o nome do futebol brasileiro em todas as partidas que fiz”, diz, em tom de dever cumprido.

De volta ao Brasil, Dino não hesitou em aceitar o convite para defender o único integrante do Trio de Ferro pelo qual ainda não havia jogado: o Corinthians. Chegou ao clube em um momento difícil, de jejum de títulos. Não conseguiu quebrar a seqüência sem conquistas, mas fez um bom trabalho, que o credenciou a assumir o comando da equipe, em 1969.
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Dino Sani, Olten Ayres de Abreu e Ditão, no Pacaembu, em 1965: quem ganhou o “toss”? E o jogo?
Este jogo foi 1 x 1, realizado em 04/04/65, com gols de Dino para o Corinthians e Ivair para a Portuguesa ( Gilberto Maluf )

Estava iniciada sua carreira de técnico. Na nova função, ele levou o Alvinegro do Parque São Jorge a pequenos títulos, como o da Copa Costa do Sol, disputada em Málaga, em 1969, e do Torneio de Nova York, no mesmo ano, mas não conseguiu tirar o time da fila.
Apesar disso, o trabalho no Corinthians rendeu a Dino Sani um convite para dirigir a seleção brasileira, pouco antes da Copa de 1970. “O João Saldanha era uma pessoa espetacular e muito meu amigo. Por isso, quando ele foi afastado da seleção, achei uma injustiça e não poderia aceitar trabalhar no lugar de um amigo”, explica.
O sucesso como treinador viria no Internacional-RS. Ele chegou ao time em 1971 e o levou à conquista de três Campeonatos Gaúchos seguidos. Como o Colorado já havia levado o título em 1969 e 1970, colaborou para o histórico pentacampeonato. “Foi a melhor experiência pela qual passei como técnico”.
Dino Sani dirigiu ainda clubes como Goiás, Palmeiras, Coritiba, Flamengo e Ponte Preta. Também teve aventuras no exterior com Boca Juniors, da Argentina, Peñarol, do Uruguai, Humiuri, do Japão, e seleção do Catar. Com o Peñarol, conquistou um dos títulos mais importantes da carreira, o uruguaio de 1978.

Tal qual Beckenbauer, Fernando Redondo , Didi, entre outros, tocava de três dedos, de trivela, de “fianco”. O bico de sua chuteira nunca se gastava. ( Gilberto Maluf )

Jornal O Esporte – 1958

Tudo a ver, 50 anos depois.

Silvio Marcilio , na época em que o Brasil sagrou-se campeão mundial de futebol na Suécia, era redator esportivo do Jornal O Esporte. Naquela ocasião o referido Jornal ofereceu um almoço à delegação brasileira e no convite tinha os seguintes dizeres: a vocês, que elevaram bem alto, em campos da Suécia, o nome do Brasil; a vocês, que souberam honrar um povo, enobrecer a raça, dando motivo a que se orgulhasse de seu feito a Pátria estremecida, o esporte oferece esta homenagem singela, mas sincera e tocante, pois parte do coração e do sentimento mais profundo de gratidão. Podem estar certos, craques destemerosos da seleção nacional, campeã do mundo, que essa vitória, que a todos emocionou, que a maioria fez verter lágrimas de agradecimento, foi a mais alta contribuição do futebol nacional para que o nome do Brasil se alçasse às culminâncias sonhadas pelos nossos maiores e pela gerações presentes. A vocês nossa imorredoura gratidão, a gratidão de todos quantos labutam no decano dos especializados de São Paulo, o esporte.
Menu do almoço
– Coquetel à Áustria: 3×0, Frios à Inglaterra: 0x0, Salada à U.R.S.S.: 2×0, Churrasco a País de Galles: 1×0, Vinhos à França: 5×2, Final à Suécia: 5×2, Champagne à Marechal da Vitória (Dr. Paulo Machado de Carvalho), Charutos a Feola e Café a Brasil.

Guardo com muito carinho o convite autografado por diversos jogadores, entre eles um que assinava Edson Arantes (Pelé), presente que meu cunhado me deu. Lembro-me da chegada da delegação em São Paulo, tendo ido comemorar no Vale do Anhangabaú, esperando a passagem da Delegação em cima do carro do Corpo de Bombeiros em carreata até o Estádio Municipal do Pacaembu que passou a chamar-se Dr. Paulo Machado de Carvalho (o Marechal da Vitória).
Autorizado pelo autor, Adolpho Aducci.

O dramático Super-Super de 1958 – Campeonato Carioca

Contém o artigo de Ney Bianchi publicado na revista Manchete Esportiva no. 166, de 24 de janeiro de 1959, e a transcrição da narração do gol do Vasco pelo locutor Valdir Amaral.
Contém reportagem do site NetVasco e fotos jornal O Globo em sua edição esportiva especial.

No campeonato de 1958 aconteceu um fato inédito no futebol carioca: foi necessária a realização de dois supercampeonatos para a decisão do título. Após a disputa dos dois turnos normais, Vasco, Flamengo e Botafogo estavam empatados com 12 pontos perdidos. Por isso, houve o primeiro super, que tambem nao decidiu, já que, ao seu final, havia nova igualdade entre os três clubes, cada um com uma vitória e uma derrota. Somente no segundo super surgiu o campeão carioca de 58: O Clube de Regatas Vasco da Gama.
E a conquista do clube vascaino foi inteiramente justa, porque durante quase todo o certame esteve sempre em situação de superioridade na tabela. Faltando duas rodadas, o Vasco possuia quatro pontos de vantagem sobre Botafogo e Flamengo. Bastaria um empate em qualquer dos dois últimos compromissos, justamente contra aqueles dois adversários, para garantir o título. Porém o Vasco deixou escapar o titulo praticamente ganho, perdendo para o Botafogo por 2 a 0 e para o Flamengo por 3 a 1.
O Vasco comecou o supercampeonato, no dia 21 de dezembro de 1958, vencendo categoricamente ao Flamengo por 2 a 0, com gols de Pinga aos 11 e Almir aos 26 minutos do primeiro tempo. Uma semana depois, o Flamengo venceria ao Botafogo por 2 a 1. Bastaria ao Vasco, portanto, um empate contra o Botafogo, no dia 4 de janeiro de 1959. Estava escrito, porém, que nao seria ainda dessa vez que o Vasco voltaria com a faixa para Sao Januário. Jogando com mais acerto e empenho, mesmo desfalcado de Nilton Santos, que havia sido expulso contra o Flamengo, os alvinegros triunfaram por 1 a 0, gol de Paulinho Valentim aos 3 minutos do primeiro tempo, adiando novamente a decisao.
Se pouca gente acreditava no Vasco depois da derrocada das duas últimas partidas do returno, agora menos ainda. Em Sao Januário, aumentava a perseguicao ao técnico Gradim, um homem bom, simples e sóbrio, acusado de “nao ter nome”. Não somente em Sao Januario, mas na imprensa, no rádio, na televisão, se pedia a cabeca do técnico. So’ assim, diziam, o Vasco poderia ser campeão. Mas Gradim não estava ali por acaso. O time estava com ele, acreditava nele. Jaime Soares Alves, principalmente, o diretor de futebol, so’ acreditava nele. E o sustentou no cargo contra vento e mare’.
O super-supercampeonato seria ainda mais mais dramático que o super. Desta vez, foi determinado que a abertura seria entre Vasco e Botafogo, no dia 10 de janeiro. Para surpresa dos que ja’ nao acreditavam nele, o Vasco alcancou uma vitoria incontestável por 2 a 1. Pinga abriu a contagem para o Vasco aos 8 minutos do primeiro tempo; Quarentinha empatou aos 44; e Pinga novamente, aos 8 do segundo tempo, deu a vitoria ao Vasco. O Vasco alinhando: Helio; Paulinho, Bellini, Orlando e Coronel; Ecio e Valdemar; Sabara’, Almir, Roberto Pinto e Pinga. O Botafogo com: Amauri; Caca’, Tome’, Paulistinha e Nilton Santos; Pampolini e Didi; Garrincha, Paulinho, Quarentinha e Neivaldo.
No dia 14 de janeiro, jogaram no Maracanã Botafogo e Flamengo. Houve empate de 2 a 2, numa partida sensacional. Os rubronegros viraram o primeiro tempo com a vantagem de 1 a 0, gol de Dida aos 7 minutos. Os alvinegros viraram no segundo tempo com dois gols de Quarentinha aos 21 e 25 minutos, mas Luiz Carlos empatou definitivamente a partida aos 30.
Desta maneira o Vasco chegava a ultima partida do super-super, novamente precisando apenas do empate. So’ que, desta vez, com qualquer resultado sairia o campeao. Na noite de sabado, dia 17 de janeiro de 1959, o Vasco de camisas brancas com a faixa diagonal negra, calcoes e meias brancas, e o Flamengo, de camisas rubronegras, calcoes brancos e meias rubronegras, entravam em campo no Maracana lotado.
O jornalista Ney Bianchi assim descreveu a partida na revista Manchete Esportiva :
1×1 NA DECISAO DO “HIPERCAMPEONATO”: VASCO, CAMPEAO DO “ANO DE OURO”
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E tudo acabou como devia acabar: o Vasco, enfim, em sua quarta tentativa, premiado com o título inédito, pelo qual sofreu mais do que todos. O Flamengo, sem sair derrotado, mantendo a cabeca erguida, num adeus de fibra e categoria. E o jogo, em si, brilhante, nervoso, estrategicamente bem mexido, e, individualmente, jogado com aquela arte que so’ o jogador brasileiro possui.
Os dois comecaram iguais: o Vasco defendendo com oito e atacando com seis. Sabara’ e Pinga – mais Sabara’ do que Pinga – desceram sempre, notadamente na primeira etapa. Da sua parte, o Flamengo trazia Baba’ e Luis Carlos para desfazer os momentos de maior perigo. Quando avançavam, os dois times o faziam com igual decisão. Será interessante notar, no terreno puro da tática, que não esteve alheia ao jogo, que os dois conjuntos se metamorfosearam por igual, com suas manobras. Começaram em 4-4-2, chegaram a estar numa espécie de 5-3-2 (o Vasco descendo Écio como quinto homem de área e o Flamengo recuando Moacir), e por fim, estabilizaram-se num 4-3-3, desconcertante pela velocidade e pelas pinceladas de arte futebolistica que marcaram sua aplicacao pelos dois bandos.
DOIS TIMES DISPOSTOS A TUDO
As ordens do comando, porém não prejudicaram – e isso nunca poderia suceder – ao jogo, de uma forma geral. Houve provas de conjuntos primorosos e com suas respectivas lições bem decoradas. Houve artimanhas individuais de categoria exemplar. Houve, sobretudo, velocidade. Foi um dos jogos mais velozes dos últimos tempos. Dentro disso tudo, vale destacar as performances individuais de Paulinho (excepcional), Belini, Valdemar, Roberto, Sabara’ e Pinga entre os hipercampeoes, e Fernando, Pavao, Henrique e Baba’ entre os vice-campeoes.
Num jogo onde os dois esquadroes vao para campo dispostos a tudo, e’ louvável, ainda, que se possa falar em alta esportividade, como a que se verificou ao final. Foi um jogo duro, mas nunca desleal.
UMA ETAPA E UM GOL PARA CADA TIME
O primeiro tempo foi mais do Flamengo. Movimentava-se melhor, revezava com inteligência seus homens de ataque, forcando com precisão enervante o último reduto vascaino. Nesta etapa os cruzmaltinos tiveram que se defender com unhas e dentes. No período complementar, porém, o Vasco deu o troco. Voltou calmo e jogando no chão. Roberto desceu para policiar Baba’, e Sabara’ conquistou definitivamente a meia-cancha. Ai’ o Vasco cresceu, encurralando o Flamengo ate’, pelo menos, marcar seu gol. Depois houve a reação desesperada do Flamengo e o empate. Mas o Vasco continuou mais calmo e mais senhor das acoes, mantendo, assim, o resultado que lhe deu o titulo.
O gol de Roberto foi marcado aos 13 minutos. Sabara’ centrou, Roberto recebeu livre, a defesa do Flamengo parou pensando que ele estava impedido (nao estava, pois do outro lado, Jadir lhe dava condicao de jogo), e o tiro partiu seco, batendo Fernando inapelavelmente. Aos 24 minutos, Baba’ empatou para o Flamengo. Moacir bateu uma falta, Belini devolveu de cabeca, Baba’ travou, nao foi atacado e fuzilou Miguel.
OS DETALHES DA PARTIDA
Eunapio de Queiros cumpriu magnifica atuacao. Bem ajudado pelos jogadores, pode mostrar que e’, realmente, o melhor juiz da cidade. A arrecadacao somou a cifra recorde de Cr$ 5.621.768,00 com um publico pagante de 130.901 e uma assistencia total de cerca de 150.000 pessoas. Como renda, foi a terceira do Maracanã, em todos os tempos (primeiro: Brasil x Uruguai, segundo: Brasil x Espanha) e como publico, o quinto (Brasil contra Uruguai, Espanha, Suecia, na Copa de 50, e Brasil x Paraguai, eliminatoria da Copa de 54, as maiores plateias). Como campeonato carioca, entretanto, nada ultrapassou esse jogo, até hoje. E dificilmente ultrapassara’. Os dois times jogaram assim: VASCO DA GAMA: Miguel(nota 8), Paulinho(10), Belini(9), Orlando(8) e Coronel(8); Ecio(8), Valdemar(9) e Sabara'(9); Almir(9), Roberto(10) e Pinga(9). FLAMENGO: Fernando(8); Joubert(8), Pavao(9), Jadir(8) e Jordan(8); Moacir(8), Dequinha(8) e Baba'(9); Luis Carlos(8), Henrique(9) e Dida(8).
Aqui estao registradas as situações de maior emoção nos 90 minutos.
PRIMEIRO TEMPO
5 minutos – Sabará, deslocado para o miolo, dá a Pinga, que avanca, chuta e Fernando agarra firme. Perigo.
8 minutos – Almir trama com Sabara’, este da’ para Pinga, que chuta violentissimo, rente a trave.
12 minutos – Moacir, em brilhante jogada, entrega a Baba’, deslocado para a meia direita, que fuzila. Grande perigo.
14 minutos – Luis Carlos passa por Coronel e Orlando, e atira um rojao que passa raspando.
16 minutos – O Flamengo cresce. Agora Moacir da’ a Henrique, este a Dida, que balanca o corpo e chuta com malicia. Miguel salva.
21 minutos – Dida esta’ com toda a corda, agora corta Belini e fuzila. Miguel manda a corner.
30 minutos – Agora e’ Sabara’. Sempre deslocado, vai pelo miolo; perto da area, arremessa, perigosamente.
31 minutos – Valdemar faz falta. Henrique da’ um petardo que passa pela barreira. Defende Miguel depois de largar.
36 minutos – Sabara’ avanca pela ponta esquerda, da’ a Almir que, na corrida, atira pelo alto, rente a trave.
43 minutos – Almir da’ um esticao para Valdemar, que fuzila. Fernando voa e manda a corner. Perigo.
45 minutos – Ecio a Sabara’, este a Pinga, que avanca pelo centro e desfere petardo potente, rente a trave.
SEGUNDO TEMPO
2 minutos – Sabara’ cobra um “hands” com perigo. A bola passa pela barreira e Fernando defende, larga e sofre falta.
5 minutos – Sabara’, um leão, avanca pela esquerda da’ a Pinga no centro, que vira, sensacional, rente a trave.
7 minutos – Ecio da’ a Almir, que perde, recupera e atira pela ponta, na corrida. Fernando afasta com esforco.
13 minutos – Sabara’ trabalha pelo miolo, Roberto recebeu pela ponta direita, solto, avancou e fuzilou. Era o primeiro gol. NARRAÇÃO DO GOL:
Da cabine da radio Continental, Waldir Amaral narrou o lance dessa maneira: Coronel atira… pela esquerda do ataque do Vasco a Sabara’. Cortou Jadir pelo prolongamento da grande Área do Flamengo. Jadir põe para Moacir. Interrompe a jogada em ótimo lance o pernambuquinho Almir e deu para Sabara’! Recolheu Sabara’ o passe de calcanhar de Almir e ja’ soltou pela direita a Valdemar. Penetra Valdemar. Aciona na entrada da área a Roberto, que atira, e’ gol! Gol do Vasco da Gama! Gol de Roberto! A imensa familia do Almirante faz espoucar foguetes e e’ um alarido tremendo em Maracana! Gol de Roberto, sacudindo a torcida do Almirante em Maracana! Pelo meu cronometro, doze minutos e meio da etapa complementar. Doze minutos e meio da etapa complementar. Gol de Roberto, Vasco da Gama 1, Flamengo 0.

19 minutos – Falta contra o Vasco. Cobra Henrique. Bate na barreira. Na recarga, Dequinha chutou perigosamente pelo alto.
20 minutos – Pinga livra-se de Jadir, avanca como uma bolide, e, meio sem angulo, atira rente. Susto do Fla.
25 minutos – Falta batida por Moacir; defesa rebate e Baba’, na corrida e de fora da area, empata, descambado para a meia direita.
31 minutos – Baba’, em lance isolado, avanca e da’ um chute perigosissimo. Miguel se estira e defende no canto.
40 minutos – Corner batido por Baba’. Dida, num bolo de jogadores, pula e cabeceia pela esquerda da meta de Miguel.
42 minutos – Valdemar comete pexotada, passando a bola para Dida, que da’ a Henrique, livre. Belini, na corrida, desarma-o.
44 minutos – Henrique, lancado pela direita, da’ uma puxada para Baba’, que cabeceia perigosamente. Defende Miguel, com esforco.
No vestiário, Roberto Pinto, com o pe’ enfaixado, pagou o tributo de autor do gol vascaino, recebendo uma infinidade de abraços mais e menos apertados, sendo carregado em triunfo um sem número de vezes, tendo que descrever o gol ate’ ficar rouco. Mas, falando de sua emoção, declarou o seguinte:
— Acho que herdei do meu tio Jair Rosa Pinto o temperamento frio. Claro, fiquei contente. Foi, porem, uma emocao controlada. Incluindo os titulos de juvenil, fui oito vezes campeao pelo Vasco.
Na segunda-feira, dia 19 de janeiro, a primeira pagina do caderno esportivo de O Globo estampava em sua manchete: “SUPERCAMPEÃO O VASCO”, e destacava as sequencias de fotos dos gols da partida. No pe’ da pagina, uma foto, tirada no vestiario, dos sorridentes Roberto Pinto e seu tio Jair, abracados.
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