A padronização na escalação dos jogadores nos primórdios do futebol no Maranhão

O futebol no Maranhão, assim como em outros lugares do país, teve seu início vinculado às elites locais e, portanto, de acesso restrito e segregador. Um esporte de cunho tão nobre quanto este, praticado por homens considerados verdadeiros cavalheiros, exigia certo padrão nos nomes dos atletas, e esta influência é notadamente estrangeira, nos quais se sobressaíam os sobrenomes, mas não estranha aos brasileiros, já que este também foi um legado de nossa colonização portuguesa, a exemplo dos nomes dos intelectuais e políticos a seguir: Gonçalves Dias, Gonçalves de Magalhães, Castro Alves, Deodoro da Fonseca, Machado de Assis, Nina Rodrigues, Campos Sales, Rodrigues Alves, Coelho Netto, Paula Ney, Lima Barreto, Medeiros e Albuquerque, Cruz e Souza, Araújo Porto Alegre, Barbosa de Godóis, Gomes de Sousa, Monteiro Lobato, Veiga Miranda, Oliveira Lima, entre outros. No futebol local isto ocorria, mas a forma como eram nominados os atletas deixa clara a forte influência britânica. Basta ver algumas das interessantes escalações dos primeiros tempos, como as destas equipes do FAC (Fabril Athletic Club) e do Maranhense FC (1910):

TEAM “A”
J. Mário, F. Machado, A. Gandra, F. Campos, A. Santos, J. Gomes, A. Faria, T. Downey, C. Reade, A. Figueiredo.
Capitain – J. Gomes.

TEAM “B”
A. Lima, B. Queiroz, M. A. Santos, A. Vieira, José Ferreira, D. Rodrigues, J. Santos, sobrinho, L. Mello, J. S. Soldatt e C. E. Clissold.
Capitain – C. E. Clissold.

Também na composição de times pequenos, como o União S. Club, a tônica ainda predominava: “J. Marinho, J. Meireles, Bilio, Hilton, Francisco, Custodio, F. Guimarães, Edgar, C. Martins, Carlos B. e J. Gomes. Rezervas: A. Valente e H. Gomes” [sic].
O FAC, o mais influente clube de futebol da época, foi o responsável por uma mudança de iniciativa na padronização das escalações, modificando essa desnecessária rigidez e permitindo o uso de nomes mais simples (Reinaldo, Cláudio, Euclides, Quincas) e até apelidos (Totó, Cutuba, Coroca), e isto deve ser datado a partir de 1916, como nestas escalações dos times internos do clube:

Os teams estão organizados da seguinte forma: – Black & White – Tavares (goal-keeper); Leite e Totó (full backs); Reinaldo, Claudio e Ferreira (half backs); Schloback, Fritz, Lebre, Anequim e Euclides (forwards). – Red & White – Avefar (goal-keeper); Cutuba e Lisboa (full backs); Borjes, Paiva e Quincas (half backs); Novas, Galas, Coroca, Bessa e Travasso (forwards) [sic].

Uma semana depois da partida citada, no jogo interno do FAC, já entre os teams White x Blue, a escalação do primeiro foi a seguinte: Torquatinho, Moleiro, Bananinha, Girafa, Cabo Zé, Camorim, Paraguai, Acari, Coutinho, Sepetiba e Terereca. Daí em diante, a nomenclatura dos atletas não mais se modificou, prevalecendo a utilização dos prenomes e apelidos.
Curiosamente, as funções dos jogadores, os lances da partida, a terminologia do campo, as bolas, os gols, tudo ainda continuava sendo expresso à inglesa, rigorosamente, criando um ambiente que relembrava as origens modernas do foot-ball. E isso perdurou ainda por muito tempo nos gramados do Maranhão.
De 1907 a 1930, o que se via nos jornais, não apenas na Pacotilha (uma das maiores referências jornalísticas do início do futebol maranhense), é um desfilar de palavras em inglês. Até durante as partidas, carinhosamente chamadas de matchs, era possível ouvir as pessoas gritando “hip, hip, hurrah!”, e outras expressões, como no jogo FAC 3×4 Tiradentes (navio), quando a torcida não parou de gritar no velho e bom idioma bretão, como relatam os periódicos da época.
Como é de se imaginar, isso tudo devia soar muito estranhamente aos ouvidos dos que integravam as camadas mais populares, assim como o próprio futebol em si, então um esporte novo, mas de acesso restrito aos cavalheiros de “boa estirpe”, caso também estivessem em dia com suas mensalidades nos clubes onde eram sócios…

FONTE:
Claunísio Amorim Carvalho
“Terra, grama e paralelepípedos (os primeiros tempos do futebol em São Luís: 1906-1930)”, Ed. Café & Lápis, São Luís, 2009.

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