A fascinação do futebol e suas imbricações políticas não seriam encaminhadas de forma tão diferente na Espanha. Como ocorreu em praticamente todas as partes do mundo, foram também os ingleses que levaram o futebol para a Espanha. No final do século XIX, engenheiros britânicos que trabalhavam nas minas de pirita de Rio Tinto organizaram as primeiras partidas de futebol no território espanhol. Na virada do século, boa parte dos clubes que fariam história no futebol espanhol já havia sido fundada: Bilbao e Atlético de Bilbao, em 1898; Barcelona, em 1899; Espanol, em 1900, Real Madri, em 1902, e Atlético de Madri, em 1903.
Lançadas as bases do esporte, a Copa da Espanha foi inaugurada ainda em 1902, junto com a coroação do Rei Alfonso XIII, sendo vencida pelo time de Viscaya, um combinado dos melhores jogadores de Bilbao. Em 1913, foi fundada a Real Federação Espanhola, uma clara demonstração da importância que o esporte vinha assumindo no país. Nos Jogos Olímpicos da Antuérpia, em 1920, a seleção espanhola sagrou-se vice-campeã. Remonta a este momento a denominação “Furia”, criação do técnico Paco Bru, que utilizou a expressão diante da imprensa espanhola. visando caracterizar o espírito de seus jogadores diante da possibilidade de ganhar a medalha de ouro.
Apesar da unidade propiciada pela formação de uma competitiva seleção nacional, a trajetória futebolística de Espanha não seria desvinculada das identidades regionais, da tendência ao centralismo ou da luta pela autonomia em relação ao governo central uma das questões mais importantes da trajetória da Espanha moderna. Diversos clubes do país haviam nascido com uma clara identificação com o governo central, ou mesmo recebendo a chancela real após alguns anos. Em 1920, na capital, o Madri FC recebeu o selo de honra da coroa, passando a ser chamado a partir de então de Real Madri, denominação que caiu em desuso durante a experiência republicana que precedeu a Guerra Civil, com o time sendo chamado simplesmente de El Madri, mas voltou a ser utilizada com a chegada de Franco ao poder. Na Catalunha, era o Espanyol que possuía uma ligação expressiva com o Rei Alfonso XIII. Apesar de não obter uma projeção de tanto destaque quanto outros famosos clubes do país na década de 1920, esta equipe contou com um dos maiores goleiros espanhóis de todos os tempos: Ricardo Zamora. Corre uma história no clube de que quando chegou ao Kremlin a informação de que o governo espanhol passara às mãos de Alcalá-Zamora, o próprio Stálin teria indagado: “Zamora é o jogador de futebol, não é?”
Entre os clubes que representaram historicamente a oposição ao centralismo de Madri, nenhum deles atingiu a projeção que alcançaria o FC Barcelona. Na verdade, à época da fundação, poucos podiam acreditar que um clube de futebol atingisse uma transcendência capaz de representar de forma tão acabada os anseios e a projeção política e sociais criando uma identidade coletiva. O Barça – como os torcedores acostumaram-se a chamá-lo – desde cedo aproximou-se da identidade catalã, misturando-a com seus signos enquanto clube de futebol, como denota um dos gritos de guerra da equipe: isca el FC Barcelona! mosca Catalunya! (Vida Longa ao FC Barcelona, Vida Longa à Calatunha!), ou mesmo o hino do clube:
O estádio não é mais que um grito:
Nós somos Ia gente blaugrana… Pouco importa de onde viemos,
Do Norte ou do Sul,
Em um ponto nós estamos de acordo:
Uma bandeira nos torna irmãos,
Blaugrana no vento… Um grito de bravura
Faz conhecer nosso nome no mundo inteiro:
Barça, Barça, Barça!
Durante a ditadura de Primo de Rivera (1923-1930), o Barça enfrentaria momentos muito difíceis. Um dos primeiros atos do novo governo, que chegou ao poder através de um golpe de estado em 13 de setembro, foi multar o clube catalão em 10.000 pesetas por sua participação na comemoração do Dia Nacional, festejada dois dias antes. Nos anos seguintes, sob a vigilância das autoridades, o clube sofreu constantemente todo tipo de ameaças, inclusive de fechamento do seu estádio. Em muitas das manifestações políticas contra o governo de Madri, a bandeira catalã, la Senyera, foi substituída pelo estandarte do Barça. Este apresenta a inconfundível combinação do azul e do grená (blaugrana), segundo a mitologia catalã, as únicas cores disponíveis no ateliê do suíço Hans Gramper, fundador do clube, quando desenhou o uniforme dos jogadores. Recentemente, Jeff King no livro FC Barcelona: Tales from the Nou Camp (Contos de Nou Camp) retomou uma velha história em relação às cores do Barça, depois de analisar algumas cartas arquivadas pela família Gamper. Segundo ele, é bem possível que as cores do clube tivessem sido inspiradas nas cores do cantão suíço de onde veio Gamper ou de um time inglês denominado Waterloo Rugby Football Club. A última hipótese não seria nada improvável, uma vez que esta se tornara uma prática muito comum nos tempos de afirmação do esporte. O próprio Real Madri, para alguns a perfeita representação da antítese ao Barcelona, teria suas cores baseadas em um dos mais famosos clubes ingleses de sua época, o Corinthians.
Em meio à radicalização política em que o país se encontrava, viria um dos momentos mais críticos de toda a história da Espanha, a Guerra Civil (1936-1939). Neste momento, o Barcelona assumiria importante papel como um dos baluartes da resistência republicana.
Fonte:Vencer ou Morrer de Gilberto Agostino
PS:O que eu vi!!!
Amigos acrescento ao artigo uma experiência própria de vida,como um relato para agregar ao mesmo e corroborar em tudo que foi colocado acima, porque não temos a menor noção de como é de fato na prática este problema.Morei alguns meses na Espanha em 1999, mas precisamente em Madrid.Tinha amigos madrilenhos, mas como estive um tempo em Barcelona também possuía amigos catalões.Na verdade nada se compara a rivalidade que temos regionais,RJ e SP,etc…A população em geral parece que ignora a existência destas cidades,em Madrid não se fala de Barcelona e em Barcelona se ignora Madrid, as ruas da cidade de Barcelona tem seus nomes em ambas as línguas, por uma decisão governamental e só, ou seja por obrigação, a população fala o catalão normalmente, língua aliás complicadíssima.Agora de todas as rivalidades a que mais me impressionou e não sei como um clube de Madrid consegue jogar lá, são os Bascos, do País Basco, mas conhecido por nós pelo Atletico de Bilbao e Real Sociedad.Tinha um amigo Basco que conheci em Santiago de Compostela, ele tinha um ódio mortal e falo mortal porque assim ele me passava pelos madrilenhos a ponto dele me falar que se cruzasse com algum em plena rua provavelmente iriam brigar e a vontade era de morte mesmo.Eu confesso que fiquei impressionado e jamais imaginei que fosse algo assim, só vendo ao vivo mesmo para entender.