Santarém é hoje uma das mais importantes cidades da Região Norte do Brasil. Com uma população de 300 mil habitantes, é a segunda maior e mais populosa cidade do Estado do Pará (só sendo superada pela capital Belém). A cidade teve sua origem no ano de 1661 quando o padre João Felipe fundou a aldeia do Tapajós. Em 1697 os portugueses ergueram no local o Forte do Tapajós. Mas, somente em 1848 que Santarém é elevada à categoria de cidade.
A “pérola do tapajós“, como é carinhosamente conhecida, localiza-se às margens do Rio Tapajós, na confluência com o Rio Amazonas. Há muito tempo que a população local luta pela emancipação política do oeste paraense para a criação de um novo estado, que seria o Estado do Tapajós e Santarém, por sua importância política e econômica, seria a capital da nova unidade administrativa brasileira.
Além disso, Santarém foi também um dos primeiros locais da Amazônia onde o futebol foi introduzido. Hoje,o maior clássico do futebol santareno é entre o São Francisco (fundado em 1929) e o São Raimundo (fundado em 1944) que fazem o famoso clássico “Rai-Fran“,o maior do oeste do Pará. As primeiras notícias sobre o nascimento do futebol no município, foram publicadas no “Jornal de Santarém“em 1966 escrito por um ex-jogador local da época.
DÉCADA DE 10: SURGEM OS PRIMEIROS CLUBES
Até 1911, os santarenos que não tinham a oportunidade de viajar, conheciam o “Football Association” apenas através de jornais e conversas com viajantes que pela cidade transitavam. Nos colégios da capital (Belém), porém, estudavam diversos jovens que costumavam vir passar férias escolares em Santarém com suas famílias.
Foram esses estudantes, que eram componentes dos times dos respectivos colégios de Belém, que começaram a treinar a juventude local, incentivando-a e instruindo-a sobre o jogo de futebol. Os primeiros foram: Felisbelo Sussuarana (Belo), Raimundo Sussuarana (Dico), Alberico Nóvoa e Heriberto Guimarães. Depois vieram Armênio Guimarães, Almiro Nóvoa, Trajano Mota e outros.
De início, até 1912, não fora possível formar duas equipes e os treinos esporádicos eram simples bate-bolas ou peladas, completados os quadros com rapazes nativos inexperientes com o trato na bola e que aos poucos se iam adestrando.
O local dos treinos era a praça Barão de Santarém, ao lado direito da igreja de São Sebastião. Em princípios de 1913, já havia melhor organização. Demarcaram o campo com as dimensões regulamentares e fizeram traves dentro das regras do “Football”.
Então, já podendo contar com mais de 20 jogadores, foram escolhidos os melhores para formarem o “Grupo Sportivo” , a primeira entidade pebolística fundada em Santarém. Depois criaram também o “Time Negro”, dentro do mesmo grupo.
À tarde de 13 de abril de 1913, realizou-se o primeiro “match” oficial em terras tapajônicas. Teve lugar no referido campo chamado pomposamente de “Ground de São Sebastião”. Campo aberto, sem cerca nem arquibancada, entrada de público grátis e franca.
Nessa tarde defrontaram-se o primeiro time do “Grupo Sportivo” e uma equipe internacional, formada de ingleses, oficiais do vapor “Viking” da Amazon Telegraph e marujos brasileiros, tripulantes do mesmo navio. A peleja, absoluta novidade para terra, atraiu grande público e resultou na vitória do “Grupo” por 4 X 1.
Felisbelo Sussuarana, “captain” da equipe santarena, além de genial poeta, era também, um grande craque da bola – o que muita gente ignora. Ocupando a posição de “center-forward”, empolgava a torcida e desnorteava os adversários, pelas suas jogadas inteligentes, serenas, sem trancos, empurrões ou pontapés, driblando com “elegância”.
Podia-se pensar que ele até solicitava licença ao guardião das traves para vazar-lhe a rede, e no fim ainda o abraçava, como a pedir-lhe desculpas pelo “agravo”. Outro futebolista eficiente na temível linha de ataque era Alberico Nóvoa que, pela sua calma, contrabalançava a espetaculosidade de Trajano Mota e a franqueza com o “Keeper” Dico Sussuarana, chateado com a torcida que o vaiava por ter engolido algum frango,mas acabava revidando as vaias com belas arobacias braçais…
Depois do primeiro jogo, houve outros encontros cuja realização, entretanto, ficava dependente da estadia no porto de navios ingleses e nacionais como o “Viking” ou o “Ramos”. Não havia outros adversários.
Meses mais tarde, dissolvido o “Grupo Sportivo“, foi fundado em agosto de 1914 e instalado a 7 de setembro, o “Santarém Athletic Club”, cuja primeira diretoria ficou assim constituída: presidente – Felisbelo Sussuarana; vice – Felipe de Castro; 1º secretário – Dr. Mendonça Lima; 2º dito – Heriberto Pinto Guimarães; tesoureiro – Francisco Renovato; e orador – Prof. Álvaro Pinheiro.
Em 1917, foi fundado o “Paysandu Sport Club”, que, de início, se utilizava do mesmo campo, a praça de São Sebastião. Ainda em 1917, fez inaugurar seu próprio estádio, num grande terreno baldio á Rua Nova, atual Mendonça Furtado. A inauguração festiva foi realizada a 16 de dezembro de 1917, com um jogo entre o referido clube e o “Internacional Foot Ball Team” (do “Viking”).
Em maio de 1917, foi extinto o “Santarém Athletic” e fundado o “Tapajoz Foot Ball Club” com os mesmos antigos elementos esportivos, sob a presidência de Altino Mendes de Nóvoa. Em 19 de março de 1919, o “Tapajoz” se filiou ao “Yole Clube de Belém” e trocou o nome para “Tapajoz Yole Clube”.
Ainda em 1917 foi fundado no bairro da Aldeia, pelo jovem esportista Antônio Barbosa, o “Guarany Foot Ball Club”, que deu muita surra nos clubes do centro da cidade. O primeiro embate futebolístico intermunicipal em Santarém, aconteceu a 1º de julho de 1917, entre as equipes do recém-criado “Tapajoz Foot Ball Club” e do “Sport Club Alenquerense”, da cidade de Alenquer, com a vitória do Alenquerense por 1 X 0.
Acontece que na vizinha cidade ocorreu o mesmo que em Santarém. Rapazes vindos de Belém introduziram ali o “Football Association” e os esportistas alenquerenses progrediram mais do que os santarenos. Mas no jogo seguinte o Tapajoz se vingou goleando o time de Alenquer. A 17 de agosto de 1919, outro clube do bairro da Aldeia foi instalado, o “Aymoré Foot Ball Club”, que nesse dia inaugurou seu campo de esportes, aos fundos do “ground” do “Paysandu”, acabou derrotado pelo “Tapajoz”, pelo escore de 3 x 0.
Novo campo foi inaugurado a 14 de setembro de 1919; desta vez o do “Guarany”, tendo na inauguração jogado 2 combinados, compostos de esportistas dos quatro clubes locais. Esse terceiro (ou quarto) campo era situado nas imediações do antigo Prado de Corridas do “Jóquei Clube”.
Ainda no ano de 1919, no mês de Novembro, é fundado um novo clube de futebol chamado de”Paraense Club” que foi originado por elementos do “Guarany”. A primeira diretoria ficou assim definida: Presidente – Francisco de Paula Rebello; Vice – Atlante Campos; 1° secretário – Bruno José de Souza; 2° secretário – Raymundo A. da Costa; Tesoureiro – José Militão da Rocha e Capitão – Arlindo Ferreira.
É de notar, porém, que apesar de já existirem tantos campos de esporte, não havia nenhum cercado. Todos eram abertos e de franca presença de pessoas, sem necessidade de pagamento. Finalmente, em 1919, o “Paysandu” tomou a iniciativa de cercar o seu campo, ali estabelecendo pequena arquibancada com entrada paga. A inauguração festiva do estádio azulino foi a 14 de setembro de 1919, com um jogo entre os times do dono do campo e do “Tapajoz Yole Club”, com vitória deste último por 5 x 1.
Grande concorrência e muita animação, inclusive alguns “sururus”. Preço único da entrada: 500 réis. Foi esse o primeiro jogo de futebol com entrada paga, nesta cidade. A 1º de setembro de 1926, o “Tapajoz Yole Clube” deixou de existir como entidade pebolística, ficando, apenas, com caráter recreativo, tendo sido, então, fundado o “Santarém Sport Club” com os mesmos elementos do velho quadro tapajônico, e outros novos valores recrutados dos clubes congêneres, da cidade.
Em 1926, acontece em Santarém o primeiro jogo interestadual da região do oeste paraense, na qual a seleção do Amazonas ,que voltava de Belém onde perdera de 7 x 0 para a seleção do Pará pelo campeonato brasileiro, resolve fazer uma parada na cidade e aceita um convite dos esportistas locais para um amistoso contra a seleção de Santarém. Os amazonenses acabaram ganhando com facilidade do escrete local por 7 x 1.
Eis que surge um dos melhores clubes de futebol de Santarém desse período, o “Santa Cruz Sport Club” que por muito tempo foi incontestavelmente, o “Papão” dos gramados tapajônicos. Sob a presidência de Gregoriano Queiroz , o “Santa Cruz” alinhava um quadro bastante respeitado com Miguel Campos no gol,Hermenegildo Dizencourt, Quirino Barbosa, Pedro Maia, Zé Besouro, Oscar Maia, Manezinho (um becão que pelo tamanho não condizia com o apelido), Pé de Banha, Dico Gato e outros.
Também, na mesma época,era fundado um outro importante time santareno: União Sportiva, que foi fundada por jovens da Congregação Mariana e se tornou um dos melhores clubes do município. O seu grande rival era o Santa Cruz, que deu origem ao maior clássico futebolístico de Santarém em seus primórdios.
LIGA SANTARENSE É CRIADA EM 1927
Em fevereiro de 1927, foi construída a primeira Liga Esportiva, sob o nome de “Liga Santarense de Desportos”, sendo eleita a seguinte diretoria: presidente – Dr. Bernado Borges Pires Leal, do “Santarém Sport Club”; vice-presidente – Cel. Silvino Campos, do “Ypiranga Sport Club”, recém-fundado; 1º secretário – Dr. Selézio Campos, do “Santa Cruz”; 2º secretário – Pedro Morais, do “União Sportiva Club” ( que daria origem ao atual “São Francisco”); tesoureiro – Dr. Fernando Leal, do “Santarém”.
Essa instituição, apesar dos esforços e boa vontade dos seus dirigentes, não conseguiu harmonizar os pontos de vista das diversas agremiações locais, que eram, na época, salvo engano, o “Santarém”, o “Santa Cruz”, o “Ypiranga” e a “União Sportiva”, também recentemente instalada e o “Brasil Sportivo”, em organização.
Assim, a Liga Santarense de Desportos entregou os pontos sem ter feito coisa alguma pelo esporte da terra. Mais tarde surgiu outra tentativa que também fracassou. Em um jogo realizado em 5 de junho de 1927 com a “União Sportiva”, o famoso “Santa Cruz”, pela primeira vez desde a sua fundação, teve quebrada a sua invencibilidade, caindo pelo escore de 2 x 1. Houve foguetório e lamentações.
União Sportiva da Congregação Mariana
Em junho de 1916, o irmão leigo Franciscano Frei Bernardo, deu início aos fundamentos do prédio que iria servir de residência aos padres da Prelatura, situado à avenida São Sebastião. Treze meses depois, era a casa inaugurada exatamente a 29 de julho de 1917. A 21 de janeiro de 1918, na parte térrea do edifício começou a funcionar o “Colégio São Francisco” com a matrícula inicial de 52 rapazes, sob a direção do saudoso Frei Ambrósio.
Desde logo, o emérito educador e amigo da juventude santareno começou a preparar o vasto terreno contíguo ao Colégio, para servir de recreio aos alunos do novel estabelecimento de ensino. Chamou-se ao campo: “Recreio do Colégio São Francisco”, e ali, embora ainda sem franquia ao público, brincavam diariamente os meninos, nas horas de folga. Lógico que um dos principais entretenimentos da gurizada era o nascente joguinho do “pé na bola”. Com o passar dos anos, foi ali um constante viveiro de futuros craques, que, depois, iam exibir suas qualidades pebolísticas nos times dos clubes já existentes na cidade.
Alguns anos depois, os alunos do “São Francisco” já eram contados por mais de centenas, então, foi fundada a “União Sportiva da Congregação Mariana”. O campo do Recreio foi aumentando, desbastado das árvores restantes, cercado com estacaria de itaúba, aberto um portão independente (pois até então a entrada era pelo Colégio).
Depois construíram pequena arquibancada, etc. Finalmente, o “Play-Ground” do Colégio, sob a nova denominação de “Parque de São Francisco”, foi festivamente inaugurado à tarde de 12 de dezembro de 1926, com o comparecimento de autoridades, familiares e povo em geral.
O novo estádio apresentava ornamentação de palmeiras, bandeirolas, faixas, e muita alegria. Tocou, a “Filarmônica Franciscana”, composta de alunos do Colégio sob a batuta do inesquecível musicista mestre Luiz Barbosa. Se enfrentaram os times dos “donos da casa” e do “Santarém Sport Club”. Empate de 2 x 2. Entrada grátis, para acostumar a freqüência.
Já a 16 de janeiro de 1927, dois clubes estranhos utilizaram o Parque: “Santa Cruz” e “Santarém”. Entrada paga, sendo 1.000 réis a arquibancada e 500 réis a geral. Desta data em diante, todos os jogos adotaram o regime de entrada paga, e tiveram por arena o antigo “Recreio do São Francisco”, hoje denominado “Estádio Municipal Aderbal Corrêa”.
SÃO FRANCISCO SPORT CLUB SURGE EM 1929
No dia 30 de Outubro de 1929, alunos do colégio São Francisco, entre eles os irmãos Miguel, Adalgiso e Otávio Paixão mais os amigos Guilherme Colares, Rafael Santana e Liberalino Machado (e outros que não tiveram espaço na União Sportiva), resolveram fundar também seu clube de futebol, o São Francisco Sport Club.
O nome escolhido foi uma maneira de homenagear a instituição em que estudavam como também ao Frei Ambrósio (que era devoto do santo), um grande incentivador do futebol local na época. Inicialmente suas cores eram o preto e branco, mudando logo depois para o azul e branco, sendo que os uniformes contendo as novas cores do clube foram adquiridos em Belém pelo senhor Geraldo Alho.
O São Francisco se tornou, ao longo dos anos, uma das maiores forças do futebol santareno, sendo hoje o clube mais antigo da cidade em atividade. Atualmente, Santarém conta com três times nas duas divisões do futebol paraense: São Raimundo, São Francisco e Tapajós (que não é o antigo).
FONTE: Prof. e Pesquisador do Futebol Amazonense, Gaspar Vieira