A TV evita que assaltos a apito armado sejam cometidos em campo, como se fazia nas Libertadores da América dos anos 60 e início dos anos 70. A transmissão de futebol pela TV democratiza. Fiscaliza. É cidadã no esporte, como deveria ser em outros aspectos de nossa vida. Mas a imagem da televisão não pode ter o controle remoto do futebol. Os botinudos têm de ser punidos pelos safanões e sacanagens que cometem em campo, como bem fez o STJD em 2003, como mal se tocou no ano que passou. A imagem da TV pegou e mostrou o que o árbitro não viu no campo? O tribunal pega o vídeo e pune.
Como poderia ter pego Pelé, na Copa de 70. Sua majestade deu uma cotovelada criminosa no uruguaio Fuentes. O árbitro não viu a ação de Pelé e só marcou a falta. Mas o uruguaio já deveria ter sido expulso pelo conjunto da obra, e pela ficha corrida de infrações na partida, válida pela semifinal do Mundial no México).
A Fifa só foi dar um pau nos que baixam a paulada na Copa de 94, quando meteu um gancho no lateral italiano Tassotti, que deixou um cotovelo no rosto do atacante espanhol Luis Enrique. Pênalti que o juiz não viu, mas o planeta enxergou.
Passados dez anos, apenas no ano retrasado o nosso STJD velho de guerra hasteou a bandeira branca e deixou as punições brandas no passado. Nossa justiça tardou, mas não falhou. Não é mais cega ao que a televisão mostra de violência em campo e na arquibancada.
“MUDERNOS” – Só não podem os analistas fashion invadirem o campo botando a televisão em campo como se fosse uma instalação artística, um videowall. Todas as questões do jogo não podem ser decididas pela televisão e pelo videocassete. A imagem não pode marcar pênalti – que é interpretativo, logo, subjetivo, individual. O computador não pode contar os centímetros de um impedimento. O dedo do homem não pode se meter como se fosse a mão de Deus. Como Diego, na Copa de 86, no México. Ele meteu a mão na Inglaterra, e o árbitro não viu o que o planeta inteiro observou pelo replay.
Um lance claro, cristalino. Mas para quem está na poltrona, no bem-bom, na frente da TV.
INTERPRETAÇÃO – A regra é assim. Cada um tem a sua opinião. Muitas vezes, nenhuma conclusão, depois de minutos de discussão, e de observação de um mesmo lance várias vezes, por vários ângulos.
O famoso terceiro gol da Inglaterra, na Copa-66, na decisão contra a Alemanha, em Wembley. Eu ainda não havia nascido e até hoje se discute se a bola entrou. Vendo e revendo, é difícil ter a convicção que o assistente Tofik Bahrmarov teve no lance – gol. “Gol” que não foi, diga-se, vendo muitas vezes o lance.
Imagine se a regra permitisse o uso do vídeo? E aí: meia-hora ou 40 anos discutindo o lance? Você gostaria de esperar o árbitro apertando o rewind do vídeo na lateral do campo?
Se a arbitragem errou, azar. O goleiro da Seleção franga. O artilheiro perde gol feito. Por que não pode o árbitro errar? Só ele não tem esse direito. Por mais que possa ser desumano um erro de apito, o juiz ainda é humano. Ele erra, e muito. Como eu. Como você. Como a sua televisão.
Que, convenhamos, tem errado mais do que deveria.
Mauro Beting