Foram 16 jogos desde brasil 3 x 1 Bulgária, antes da Copa de 1958. Dezesseis vezes que Pelé e Garrincha jogaram juntos pela Seleção. A última partida da dupla foi em Liverpool, no estádio do Everton (Goodison Park), para 47 mil pagantes
O primeiro jogo do Brasil na luta pelo tri mundial, em 1966. Também Brasil x Bulgária. Eternamente Pelé & Mané. Eles ainda não sabiam que seria a última vez – mesmo com a má fase de Mané e os problemas nos joelhos tortos mais certos da história da bola.
Ninguém consegue desejar e muito menos se despedir da maior dupla do futebol. E os deuses da bola, sem saber sabendo, fizeram das deles: Pelé fez o primeiro gol brasileiro cobrando falta; Mané fez o segundo gol cobrando falta.
Djalma Santos (Palmeiras), Denilson (Fluminense), Bellini (São Paulo), Gilmar (Santos), Altair (Fluminense) e Paulo Henrique (Flamengo); Mário Américo (massagista), Garrincha (Botafogo), Lima (Santos), Alcindo (Grêmio), Pelé (Santos) e Jairzinho (Botafogo). Técnico: Vicente Feola.
Um gol para cada um.
E o último lance do último jogo passou pelos pés dos dois. Pelé avançou por dentro e tocou para Lima dar um leve toque para Garrincha arriscar de fora da área e acertar a rede – pelo lado de fora.
Não deu nem saída. O jogo acabou ali. A dupla, unida, também. Garrincha e Pelé fizeram juntos a última jogada da partida. O último lance deles juntos pelo Brasil.
Os deuses da bola não botaram aquela bola lá dentro. Mas deram um jeitinho de fazer em um campo do país que inventou o futebol 103 anos antes a última jogada da dupla de gênios que reinventou o futebol.
O JOGO
No dia 12 de Julho de 1966, o Brasil começa com a bola mas errando passes, como Lima, que bateu uma falta do pé do rival (JOGO MARCA A PRIMEIRA PARTIDA EM COPAS DO MUNDO DE UM BRASILEIRO QUE NÃO ATUAVA NEM POR UM CLUBE DO RIO E NEM POR UMA EQUIPE DE SÃO PAULO: O CENTROAVANTE ALCINDO, DO GRÊMIO).
3min – Primeira bola tocada para Garrincha. Estádio de Liverpool faz WAAAAAAAL. Mas nada acontece.
5min – Djalma toca para Garrincha que prepara a inversão de bola para a ponta esquerda onde está o improvisado Jairzinho. Mas Mané fura ridiculamente a bola. MELHOR NÃO REVER ESSE LANCE…
6min – Os cerca de 7 mil brasileiros em Goodison Park gritam “Brasil, Brasil!” como até hoje se faz. Pelé recebe a primeira das tantas faltas. Aliás, foram duas num só lance.
8min – Talvez em homenagem ao “kick and rush” britânico da época, Brasil abusa da ligação direta para os pontas Mané e Jair. Especialmente os dois volantes Denilson (mais) e Lima (menos). Jogo fica feio. E não flui.
8min – Primeira chance brasileira, em boa jogada do centroavante gremista ALCINDO. Ele passou por dois e bateu pra fora. O “Bugre” sabe sair da área e tabelar com Pelé.
11min – Sem a bola, Brasil se fecha com o recuo de Mané (menos) e Jairzinho (mais). Pelé e Alcindo marcam a saída búlgara. Sem a pelota, Seleção passa do 4-2-4 para o 4-4-2, com o recuo dos pontas.
13min – Pelé não fugia do pau. Nunca. Dava quase tanto quanto batia. Como a maioria dos jogadores da época, não saía rolando para simular lesões e forçar expulsões. Mas, nesse lance, cavou absurdamente a falta. O árbitro caiu na queda dele.
15min – GOL DO BRASIL. PELÉ. 1 a 0 BRASIL. FALTA DA MEIA DIREITA. PÉ DIREITO do Rei. A bola passou pela barreira, goleiro foi tarde, e saiu o primeiro gol televisionado daquela Copa. O primeiro mundial do então bicampeão mundial.
16min – Torcida brasileira canta o tradicional “Mais um! Mais um”! Mas o narrador da BBC entende que é “Brasil! Tcha, tcha, tcha!”
17min – Pelé apanha muito. Mas também cava muitas faltas. E também bate. Aliás, o Brasil bate mais que a Bulgária.
18min – Não só os volantes. Também agora os zagueiros começam a fazer a ligação direta, como o veterano Bellini. Para evitar que isso aconteça, Pelé deixa a meia-direita e tenta se aproximar dos volantes Denilson e Lima.
19min – Mesmo apanhando (e respondendo também na pancada), Pelé começa a pelezar. Mas, diferentemente do que esperava o narrador pele faz grandes lances, torcida em Liverpool está muito mais com a equipe “underdog” (zebra) búlgara.
19min – Boa troca de bola entre Pelé e Alcindo acaba em má finalização do atacante greemista.
21min – Denilson sai mais pro jogo, e Bulgária cresce.
21min – Garrincha! Garrincha! Torcida dá força ao até então discreto Mané.
21min – Pegaram Pelé.
22min – Jogo equilibrado, Pelé recua um pouco mais para armar. Brasil de Feola joga no 4-2-4 com a bola, e recua os pontas Garrincha e Jairzinho sem a bola. Mas só chega mais à frente com a saída dos volantes ao ataque, já que os pontas não vêm recolher a bola, e Jair está perdido pelo lado esquerdo, e sem assumir o protagonismo natural desse baita atacante alvinegro.
26min – A galera pediu, Garrincha jogou: driblou um, passou bonito pelo outro, ganhou o pé-de-ferro do terceiro. Agora sim.
27min – Galera grita por Pelé, que segue dando e apanhando.
29min – Jogadores escorregam muito no gramado do campo do Everton.
30min – Muito chuveiro do Brasil na área rival por parte de Mané e Jair (que, por característica, afunila mais). Paulo Henrique sai menos pelo lado esquerdo. Djalma Santos também apoia menos. Os pontas búlgaros impedem o apoio. O camisa sete rival joga mais enfiado. O 11 gosta de circular por dentro e sabe jogar (Kolev).
31min – Primeira chance búlgara. Jogo aéreo. E só.
3min – Escanteios na época eram bem diferentes: a bola saía pela linha de fundo, o ponta pegava a bola e batia o córner. Pela direita, Garrincha batia para a área onde estavam o ponta-de-lança (Pelé), o centroavante (Alcindo) e o outra ponta (Jairzinho).
35min – O melhor búlgaro, e um dos melhores em campo, o meia-armador Yakimov (13) passa por Pelé, por mais dois, e dá uma bela cavadinha pra Kolev, em ótima chance rival.
37min – Torcida grita “Brasil”. Mas de um modo mais tímido, até pelo melhor momento búlgaro em campo.
37min – Bela tabela do ataque brasileiro termina com finalização errada de Alcindo. Lindo toque de Pelé, como o vídeo abaixo mostra.
39min – Denilson baixa o guatambu em lance que seria para cartão amarelo se eles já existissem (seriam adotados a partir de 1970). Torcida inglesa grita “OFF! OFF! OFF!” pedindo a expulsão do volante do Fluminense. Não era para tanto. E nem para o Brasil fazer tantas faltas.
40min – Bulgária ataca às costas de Denilson e Lima, e para cima do lateral Paulo Henrique.
41min – Yakimov chapela bonito no meio-campo. Joga muito! Seria semifinalista da Liga dos Campeões no ano seguinte, pelo CSKA.
44min – Pelé recua e dá espaço para Lima enfiar bonito para má finalização do Bugre Alcindo.
FIM DE PRIMEIRO TEMPO. Partida boa do Brasil até 25 minutos. Depois a Bulgária foi melhor. Gol de bola parada definiu o placar parcial
SEGUNDO TEMPO
1min – Pelé arranca pela direita e goleiro búlgaro se antecipa bem.
5min – Duas porradas seguidas e mais uma pancade em Pelé. Partida volta ainda mais dura. Narrador da BBC cita o célebre massagista brasileiro Mário Américo e também a entrada em campo do doutor Hilton Gosling. A diferença básica para o futebol de hoje é que os caras davam e recebiam e não saíam rolando. Nem pedindo maca e nem cartão para o adversário.
Simulação? Só Pelé fez até agora.
5min – Bellini manda outro balão para o ataque. Deve ser homenagem da Seleção Canarinho para o “kick and rush” do futebol britânico de então e de outrora.
6min – O bom lateral-direito Shalamanov apoia bem e leva baita pancada de Jairzinho. Brasil segue dando muito.
7min – Aleluia! Sol em Liverpool iluminando o ataque búlgaro. Mas não o jogo.
8min – E segue o bumba-meu-canarinho. Agora é Djalma Santos que deixa o meio-campo brasileiro com torcicolo. A quermesse junina segue com um festival de balões em Goodison Park.
11min – Passe bizarro de Denilson para lateral. Seleção voltou pior, mas a Bulgária não se acerta também.
12min – Bom lance com Alcindo, boa defesa do goleiro.
15min – Ótima jogada brasileira, Alcindo perde o lance.
18min – Falta estúpida do bom Kolev, que perdeu a bola para sair para o contraogolpe, e acabou derrubando Mané na entrada da área.
18min. GOOOOL. 2 a 0 BRASIL. GARRINCHA DE FALTA DE PÉ DIREITO. Barreira com apenas quatro e mal armada. Bela pancada de Mané, que também havia marcado gol de falta na Copa-62.
18 minutos do segundo tempo. Garrincha vence a barreira mal colocada e acerta belo chute na meta do búlgaro xxx. Brasil faz o segundo gol em Liverpool. Mané marca o último dele ao lado de Pelé pela Seleção.
20min – Lima mostra toda sua versatilidade e qualidade. Salva de carrinho e de salva de letra (!) na lateral esquerda.
21min – Torcida brasileira começa a cantar a versão nacional da mexicana CIELITO LINDO: “Ai, ai, ai, tá chegando a hora…”
21min – Famoso lance de Garrincha pela direita, que está no clipe acima, do filme oficial da Fifa: ele vai pra lá, vai pra cá, e, no final, não acontece nada. Mas é bonito.
30min – Bulgária murchou com o segundo gol. Brasil mais perigoso, embora comece a pregar. Uma crítica de antes e, sobretudo depois da copa, que a troca do preparador bicampeão mundial Paulo Amaral pelo professor de judô Rudolf Hermanny.
33min – Pelé recebeu na ponta direita como se fosse Mané. Passou o pé sobre a bola como Garrincha. Pena que o bandeirinha impediu o lance achando que a bola saiu. Linda homenagem de Pelé a Mané no último jogo da dupla. Veja:
35min – Grande passe de Pelé para Alcindo. Boa defesa do goleiro búlgaro. Na sequência, rara falha bisonha de Gilmar. Como craque da meta que é, nada aconteceu em mais um daqueles lances perdidos pela memória. Lance para ficar pra sempre que se perdeu como o gol desperdiçado pelo centroavante búlgaro.
37min – Se Pelé foi Mané pela ponta-direita, Mané foi pra meia e bateu como Pelé. Boa chance brasileira.
38min – Pelé passou por três e goleiro fez grande defesa. Ele está querendo jogo e Copa. Passou como quis pelo seu marcador, o camisa 6 búlgaro. Jogada de grande técnica e velocidade.
40min – Torcida volta a cantar que “está chegando a hora”.
42min – Mais um bonito lance de Alcindo com Mané. Mas deu em nada.
44min – Pelé toca pra Lima que deixa para Garrincha bater em curva e atingir a rede esquerda da meta búlgara. É o úlitmo lance do jogo. O último de Pelé com Garrincha. A jogada que começou este post.
NOTAS DO BRASIL
GILMAR (6) – Quase entregou um gol para o rival. Pouco acionado.
DJALMA SANTOS (6,5) – Sofreu com o bom ponta-esquerda búlgaro que cortava por dentro, e apoiou pouco.
BELLINI (6,5) – Firme como sempre, apesar da idade. Mas extrapolou na ligação direta.
ALTAIR (6) – Discreto.
PAULO HENRIQUE (5,5) – Apoiou um pouco mais na primeira etapa e sofreu um tanto na marcação. Laterais não apoiavam tanto, então. Até por não haver espaço e pela obrigação de marcar o ponta rival que atuava bem aberto.
DENÍLSON (6,5) – Sofreu com Yakimov, que joga muito e se mexe bastante. Quando chegou à frente foi bem. Bateu um pouco além da conta.
LIMA (7,5) – Marcos, armou, atacou. Enfim, Limou. Pelo lado esquerdo, foi muito bem.
GARRINCHA (7) – Pouco para o muito que é. Mas ainda assim foi bem pelo belo gol e pela vontade para quem não estava 100%.
PELÉ (8) – Quis jogo, e a bola o quis o jogo todo. Bem técnica e bem fisicamente, o melhor disparado em campo. Cavou a falta do primeiro gol que ele mesmo marcou.
ALCINDO (6,5) – Correu, abriu espaços, saiu para tabelar, mas não foi bem tecnicamente.
JAIRZINHO (5) – Torto pela ponta-esquerda, poderia tentar entrar em diagonal. Nem isso fez. O mais frágil brasileiro em Liverpool.
VICENTE FEOLA (7) – Venceu com méritos. Mas, talvez, tenha optado por um time muito rodado. E, antes disso, fez convocações discutíveis e cortes absurdos no grupo de 22.
BULGÁRIA – Yakimov, o meia-armador, foi o melhor do rival, e dos melhores em campo. Técnico, criativo, dinâmico, fez o que houve de bom do time búlgaro.
FONTES & FOTO: O Lancenet! – Gustavo Roman – Getty