Curiosidades da história centenária do Leão do Bonfim
Dias de glórias e conquistas dentro de campo marcam a vida centenária do Villa Nova. Mas não só de feitos heróicos no futebol vive o Leão. As arquibancadas de concreto do Alçapão do Bonfim escondem casos memoráveis, que enchem de orgulho aqueles que dedicaram uma vida inteira ao time de Nova Lima. Que o diga Helena Liberato, uma das filhas do casal que ajudou a escrever as primeiras linhas dessa história.
Foto: Arquivo do Villa Nova
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Foto antiga do Alçapão do Bonfim
O alçapão ainda nem existia. Era apenas um terreno cheio de pedra, que pertencia à Mineração Morro Velho. Seu José Liberato já era funcionário da mina, aos 14 anos, e recebeu a função de desaterrar o terreno para a construção de um campo de futebol. Contou com a ajuda da até então amiga Maria Joana, que tinha 13 anos. Mas de pedra em pedra nasceu um grande amor. Os dois começaram a namorar, casaram-se e foram morar dentro do campo, numa casa construída para eles pelos ingleses da Morro Velho. Seu Zé Liberato ganhou nova função, a de zelador do recém-nascido Villa Nova, e dona Maria, a faz-tudo do time. Era ela quem confeccionava os uniformes, lavava-os, passava-os com ferro a brasa e ainda preparava as refeições para os jogadores.
Desse amor nasceram oito filhos: Maria Emídia, Odete, Juca, Osório, Vaduca, Helena, Doca e Antônio, todos no campo do Villa, conforme registrado em certidão de cada um deles. Quatro desses filhos, Juca, Osório, Vaduca e Doca, não escaparam da sina e foram jogadores do Leão de Nova Lima.
PRIMEIRA ESCOLINHA
E foi dona Maria Joana quem fundou a primeira escolinha do Villa, bem no início, quando o campo ainda era de terra e a arquibancada, de madeira. Era ela quem fazia a peneirada e a preleção. Juntava a meninada no meio do campo, dava aulas até de religião, para depois soltar a bola no chão para as peladas.
CASO DE POLÍCIA
Dick já era um jogador conhecido do Villa quando conheceu uma menina, afilhada de Américo René Giannetti, que foi prefeito de Belo Horizonte. Os dois iniciaram um namoro que virou caso de polícia. Contrário ao namoro da afilhada com o jogador, o político convocou um verdadeiro batalhão da Polícia Militar para ir ao encalço de Dick, que ficou sumido por três dias. A moça escondeu-se na casa de dona Maria Joana. Depois de ser obrigada a prestar depoimento à polícia pela acolhida à fugitiva, ela aderiu à posição de Giannetti e obrigou Dick, que não sofreu nenhuma conseqüência, a terminar o namoro.
BOEMIA
Festeiros, vários jogadores driblavam técnicos para curtir os prazeres que a noite de Nova Lima oferecia. Muitos até atravessavam a nado um rio que beirava o campo para freqüentar os bordéis da cidade. O mais boêmio deles era Anísio Clemente. Numa de suas escapadelas, ele passou a noite inteira na farra e, quando retornava, avistou de longe Yustrich, que já tinha a fama de disciplinador. O atleta escondeu-se detrás de um muro. Mas o técnico, que já o havia percebido, montou guarda ao lado do muro, por duas horas, até Anísio, medroso, fazer xixi na calça e se entregar.
CASAMENTO
Um jogador do Rio de Janeiro havia chegado recentemente para reforçar o Villa e trouxe, a tiracolo, a namorada fugida de casa. A moça acabou grávida e pediu asilo a dona Maria Joana, pois sabia que ela o faria casar. O jogador tentou enrolar a moça, mas não escapou do casamento, realizado na casa de dona Maria, dentro do campo do Leão. O bebê estava prestes a nascer quando o padre chegou. A cerimônia religiosa foi realizada às 19h e o parto, às 20h30.
FERIADO
Os treinos oficiais do Villa Nova eram uma verdadeira festa para os novalimenses, motivo para os poucos comerciantes decretarem feriado e baixar as portas das lojas para ir ao campo usando terno e gravata.
ORGANIZADA
Pelo amor ao Leão, moças da alta sociedade de Nova Lima e prostitutas reuniram-se para formar a primeira torcida organizada do time. De blusa de manga comprida longa e saia vermelha que ia até os pés, o grupo era assíduo em treinos e jogos, chamando a atenção pelas danças e gritos de guerra ensaiados.
BRIGA DE TORCIDA
Cidinho Bola Nossa já era árbitro e protagonizou uma das histórias mais engraçadas que envolveu a torcida do Villa Nova. Era jogo contra o Atlético e ele não validou dois pênaltis a favor do Leão. Levou uma surra dos torcedores e acabou acudido por dona Maria Joana. Escondeu-se debaixo da cama de um dos filhos dela até a poeira baixar. Para voltar para casa, fantasiou-se de padre e saiu do campo no camburão da Polícia Militar.
CHULÉ
O jogador Barbatana, que posteriormente foi técnico do Atlético, fugia da concentração por causa do chulé dos companheiros. Para variar, encontrava refúgio na casa de dona Maria Joana, já considerada mãe de todos.
MACUMBA
Conta-se que o jogador Orlando era o maior macumbeiro. Fazia trabalhos para amarrar os adversários e o Villa Nova sair vitorioso.
BICHO-DE-PAU-PODRE
Nunca um jogador sofreu tanto nas mãos dos companheiros quanto Tobias. Por ser o único branco na ocasião, sentia-se o melhor de todos e exigia algumas regalias. Mas nunca foi atendido. Pior, era chamado de bicho-de-pau-podre por todos no Villa Nova.
Fonte:Ludymilla Sá – Estado de Minas