Braguinha, voz viva da Copa de 58, revê criação

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Geraldo José de Almeida, pela Rádio Record, e Braga Júnior, pela Rádio Panamericana, cobriram a Copa do Mundo de 1958. Braga é o único narrador de rádio vivo dentre os que viajaram para a Suécia em 1958.

Locutor que narrou o título da seleção na Suécia admite a fantasia de imagens.

Para jornalista, imagem marcante da Copa não foi um gol, mas reação de Didi após o Brasil sair perdendo na final contra a Suécia

“”O locutor esportivo era mais um criador, formava imagens que muitas vezes não eram correlatas com os fatos. Às vezes, a partida era uma porcaria, mas era irradiada com vibração, havia sempre uma paixão acima do normal na transmissão.”

Quem diz isso é Braga Júnior, o Braguinha, locutor esportivo de rádio que trabalhou na Copa de 1958 e que, aos 75 anos, ainda esbanja um vozeirão ao atender a Folha em seu apartamento em São Paulo.

“”Pelo que dizem, eu sou o único locutor de rádio brasileiro na Copa-58 ainda vivo .”

Advogado, ele teve seu grande batismo nos microfones na primeira Copa conquistada pelo Brasil. “”Fui pé-quente”, diz.

“”Fiz curso de direito na PUC e depois comecei a discutir o rádio, o que ele deveria fazer. O locutor tinha a obrigação de fazer um espetáculo, de inventar, de fazer uma fantasia, sobretudo porque, se o camarada irradiasse triste, se retratasse fielmente um jogo horrível, seria demitido”, fala Braguinha.

E um superior dele na Copa de 1958 era “”só” Paulo Machado de Carvalho, chefe da delegação brasileira na Suécia.

“”Ele era meu chefe, mas devo dizer que estive com ele só uma vez na Copa, para resolver um problema criado na equipe. Só fui rever o doutor Paulo 40 dias depois. Pedi férias após a Copa e passei 30 dias na Europa.”

Braga Júnior narrou o Mundial quase pela paulista Rádio Record em cadeia com a Rádio Globo do Rio.

“”Eu representava a Record a mando do Paulo Machado de Carvalho. Pela Globo, deveria irradiar o Mário Garcia, mas ele brigou com o chefe da equipe. Pegaram o segundo locutor deles, o baiano Carlos Lima. Eu e ele fomos com a incumbência de irradiar, meio tempo de cada um, as partidas da Copa.”

A cobertura era bastante parcial e parceira do chefe da delegação? “”Quando tratava-se de seleção brasileira, claro que estava vestido com a camisa da equipe. O resto era só o resto. Sobre o doutor Paulo, por ele ser dono de um império de rádio e TV, era sempre potencialmente um futuro patrão. Os jornalistas tinham que considerar isso e o respeitavam.”

Com 25 anos na Copa-58, Braguinha testemunhou a proximidade de integrantes da imprensa com a cúpula da seleção. “”O Paulo, inteligente, cercou-se de três jornalistas: Ary Silva, Flávio Iazzetti e Paulo Planet Buarque. A esse grupo, juntaram-se Nilton Santos, Didi e Feola. Conversavam entre eles. Didi e Nilton Santos, jogadores fantásticos e pessoas maravilhosas, tinham grande influência na formação do time.”

Narrar aquele que para muitos foi o melhor time da história dispensou até a fantasia.

“”Tive oportunidades melhores para inventar irradiando. O Brasil tinha um time excelente, com jogadores excepcionais em todas as posições. Estava muito bem preparado, endurecido. Atribuo muito do título ao Garrincha, o melhor jogador brasileiro de seleção, no conjunto da obra”, diz Braguinha.

Uma narração marcante não foi a de um gol, foi a de um gesto: “”Quando levou o primeiro gol da Suécia, o Brasil poderia ter dado uma degringolada, mas Didi pegou a bola no fundo da rede e a colocou no meio-campo, foi uma reação máscula. O Brasil tinha aquela coisa antes de se deixar levar. Mas reagiu, empatou e dominou amplamente o time sueco.”

O melhor jogo para narrar? “”Brasil x França. O primeiro tempo foi de arrepiar cabelos.”

E deu mesmo emoção no final? “”Foi uma coisa inusitada, uma grande emoção. O pessoal recebendo medalhas de ouro, o rei da Suécia, o hino nacional… A partir dali se construiu o império do futebol brasileiro.”

TRANSMISSÕES
As dificuldades para as transmissões dos jogos da Copa-58 não eram poucas. E o sucesso não era garantia de qualidade.

“”O maior problema é que não se trabalhava com satélite, que não tinha surgido. As transmissões de longa distância eram por meio meio de transmissores enormes, SSB (Single Side Band). Na realidade, eram duas bandas, uma chegava mais ou menos e a outra muito pior. Havia muita trapalhada nesse tipo de coisa”, conta Braga Júnior.

A situação para o narrador era bem pior do que a vista nos dias atuais. “”Era um negócio meio às cegas. Não tinha retorno na Copa de 1958, era praticamente impossível nesses grandes eventos. Hoje, transmite-se com uma segurança fantástica, o cara tem o retorno, o som, às vezes até o retorno da imagem, transmite vendo o tempo inteiro o que está fazendo”, compara o narrador, que é capixaba.

E olha que a Suécia, país-sede daquela Copa, estava avançada já na época, segundo Braga Júnior. “”Era um país rico e dispunha de estrutura muito boa de comunicação. Era de se supor que um país avançado como a Suécia fizesse uma preparação grande para aquela cobertura. Queriam fazer uma divulgação de seu avanço tecnológico.”

Porém o ouvinte brasileiro sofria com a recepção, talvez mais do que com a seleção. “”Não chegava nenhuma maravilha a transmissão. Era uma espécie de sanfona, o som aumentava e diminuía. Você não ouvia como hoje, que não tem interferência nenhuma”, fala o locutor, que também levou sua voz para lutas épicas de boxe de Eder Jofre e corridas de F-1.

O fato de não haver concorrência com a TV dava outro colorido às narrações (as poucas TVs eram em preto e branco).

“Naquele tempo, não tinha a televisão para te cobrar. Irradiava gol até um minuto depois de ele acontecer”, conta Braguinha, que não ia com muita freqüência à concentração da seleção em Hindas -havia encontros com os atletas menos restritos do que ocorre hoje.

“Nós não tínhamos muito dinheiro para gastar. A nossa transmissão foi miserável. O dinheiro era exíguo, o necessário para a cobertura. Outras emissoras tinham mais recursos: a Bandeirantes, que tinha dois extraordinários locutores, Pedro Luiz e Edson Leite, e a Panamericana, que tinha o Geraldo José de Almeida, excelente locutor”, relembra Braguinha.
Sem boletins diários, havia tempo para curtir a Suécia: “Ficávamos por Gotemburgo, vendo meninas e tentando desvendar o grande mistério da época: o sexo livre das suecas.”

Narração de um gol da final

“O Brasil está perdendo por 1 a 0 para a seleção da Suécia. Vai para o ataque o time brasileiro, a bola está com Zito. Zito conduz pela sua linha intermediária, avança um pouco mais pela direita, Garrincha está solto, é lançado. Domina Garrincha, chama Axbom, passa pela primeira vez, joga para a direita, joga o corpo para a esquerda, saiu-se muito bem, passa para a frente, vai para a linha de fundo, vai se aproximando da linha de fundo. Atenção, cruzou, entra Vavá, atira, e é gol. Gooooooooolllllll da seleção brasileira. Está empatada a partida na Suécia”

OPINIÃO:
COMENTARISTA DO MUNDIAL AINDA ATUA NO RIO GRANDE DO SUL

O comentarista Flávio Alcaraz Gomes, popular na imprensa gaúcha, trabalhou na Copa de 58 e ainda atua na Rádio Pampa. Ganhou projeção com o programa “”Guerrilheiros da Notícia”, também com versão televisiva. Flávio, hoje com 80 anos, é advogado. Está entre as poucas dezenas de jornalistas do país que cobriram a Copa da Suécia.
Fonte: Folha de São Paulo

2 pensou em “Braguinha, voz viva da Copa de 58, revê criação

  1. Gilberto Maluf

    Esqueci-me de esclarecer que na foto as rádios foram invertidas. O
    Geraldo na Panamericana e Braga Junior na Record

  2. Gilberto Maluf

    A foto foi de outra reportagem e inidica que Braga Junior transmitiu pela Panamericana. Na reportagem Braga Junior diz que narrou pela Record, que parece o mais correto.

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