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Em campo, fazia de tudo: peitava, gritava, agredia até. Era seu jeito de se fazer respeitado por todos. Mário Gonçalves Vianna tinha 1.74 de altura e pesava 90 quilos de uma vitalidade que impressionava a todos que o conheceram.
Mário Vianna foi de tudo um pouco: baleiro, engraxate, jornaleiro, empacotador de velas, fiscal da guarda civil, policia especial, juiz de futebol, técnico do Palmeiras, Portuguesa e São Cristovão, e finalmente, comentarista de arbitragem na Rádio Globo.
Sua excelente condição física foi adquirida na Policia Especial. E foi apitando peladas, que José Pereira Peixoto, um policial amigo, o convenceu a fazer um curso de árbitro para Liga Metropolitana onde ingressou como primeiro colocado de sua turma. Sua estréia oficial foi na partida de juvenis entre Girão de Niterói e São Cristovão. Neste jogo ele definiu o estilo que trataria de aperfeiçoar ao longo de sua carreira até torná-la uma espécie de marca pessoal: expulsou Mato Grosso, zagueiro do seu querido São Cristovão.
Desde então, começou a construir sua fama de juiz rigorosíssimo, destes que não perdem as rédeas da partida, mesmo nas situações mais adversas. Como naquele Botafogo e Flamengo em General Severiano. Mário Vianna expulsou jogadores do Flamengo, os torcedores não gostaram e começaram a atirar garrafas e pedras contra ele. E Mário não teve dúvidas: devolveu tudo para as arquibancadas.
Mário Vianna nunca foi homem de meias medidas. Foi responsável pela única expulsão de Domingos da Guia em onze anos de carreira. Também teve uma passagem com Nilton Santos no clássico Botafogo e Vasco. Atendendo a uma denuncia do bandeirinha, expulsou Nilton Santos que era um gentleman, por ofender o auxiliar. Mário achou estranho o caso e, nos vestiários pressionou o bandeirinha que terminou confessando que tinha mentido. Ele ficou sem graça, foi ao vestiário do Botafogo e pediu desculpas a Nilton Santos.
Houve um jogador que, talvez por ser estrangeiro e desconhecer a fama de valentão de Mário Vianna, teve a infeliz idéia de desafiá-lo. Foi durante o jogo Itália e Suíça na Copa do Mundo de 1954. Inconformado com uma marcação do brasileiro, Boniperti partiu para cima do juiz aos empurrões. Mário Vianna aplicou-lhe um direto no queixo. Mandou que o carregassem para os vestiários e, ironicamente, disse para o massagista – “Se ele tiver condições, pode voltar para o segundo tempo”. Boniperti voltou bem mansinho.
Durante a Copa do Mundo de 1954, no jogo Brasil x Hungria, chamou o juiz Mr. Ellis e os dirigentes da FIFA, de ‘camarilha de ladrões’. Foi expulso do quadro de árbitros da entidade. Quando já era comentarista de arbitragem na Rádio Globo, quase perdeu o emprego por duas vezes. Na primeira, disse que o juiz Abraham Klein, além de judeu era ladrão. Os patrocinadores do programa eram, como Klein, judeus.
Como todo personagem folclórico, Mário Vianna também tinha o seu lado místico. Era espírita da linha Alan Kardec, rezava ao se deitar e se levantar. Alguns casos são conhecidos. Na Copa de 1970, era companheiro de quarto de Luis Mendes. Certa manhã ao se levantar, virou-se para o companheiro e disse – “Mendes, liga para tua casa porque seu irmão desencarnou”. Apavorado, Luis Mendes pegou o telefone, ligou para casa e ficou sabendo que seu irmão havia falecido naquela madrugada. Waldir Amaral conta que certa vez estava embarcando com Mário para São Paulo. E Mário advertiu – “Waldir esse avião vai pifar. Vamos esperar outro vôo”. – Que nada, Mário, deixe de besteiras – retrucou Waldir Amaral. Os dois embarcaram e quando o avião ia decolar, o motor enguiçou e o piloto foi obrigado a dar um cavalo de pau para não cair na baía da Guanabara.
Além dos problemas, Mario Vianna tinha outro orgulho: todos os técnicos brasileiros (da sua época), com exceção de Zezé Moreira, jogaram sob sua arbitragem. Por isso, ele se achava apto para julgar, e afirmar que Leônidas da Silva foi melhor que Pelé. Outros jogadores o enfrentaram em campo, com as armas da catimba. Zizinho, “macho dentro e fora do campo”. Eli do Amparo, “que quando tinha que expulsa-lo segurava pela pele”. E outra passagem de Heleno de Freitas. De Heleno, Mário lembrava-se com nostalgia. De vez em quando a mãe de Heleno telefonava pedindo paciência com seu filho que ele cansou de expulsar. No sul-americano de 1945, no Chile, Mário Viana apitava os treinos da seleção que tinha como técnico Flavio Costa. Num coletivo, ele marcou um impedimento e Heleno reclamou. E Mário foi logo retrucando – “ Flávio tira o Heleno do campo ou eu lhe dou uns sopapos”. É isso mesmo. Ele expulsava até treino.
Em compensação, foi suspenso tantas vezes pelas federações em que trabalhou – Rio, São Paulo e Pernambuco – que ele nem se lembra.
Quando encerrou sua carreira como arbitro, teve uma breve e frustrada experiência como técnico no Palmeiras. Como comentarista de rádio e televisão, Mario Vianna era considerado o rei das gafes.
A maior delas aconteceu quando entrevistavam, o ponta direita do Fluminense Cafuringa, num programa patrocinado pelo cigarro Corcel. Mário perguntou ao atleta – Você bebe, Cafuringa ?
– Não senhor.
– Muito bem. E fuma ?
– Fumar, eu fumo.
– Mas não deve. O cigarro é um veneno para a saúde. O cigarro faz muito mal.
O apresentador tentou avisar ao Mario Viana que o programa era patrocinado por uma fabrica de cigarro. Foi ai que o ex-arbitro deu a volta por cima.
– Todo cigarro tem veneno, Cafuringa, menos o Corcel, que tem uma dose mínima de nicotina.
Mas a sua grande mancada foi ao se despedir do apito em 1957. Ele dirigiu no maracanã um jogo de vedetes do Rio e de São Paulo. Ele mesmo é quem dizia – “Nunca ouvi tanto palavrão. Fui até agredido, e só não reagi porque eu matava uma com um soco. Mas precisei contar até dez para manter a calma.
Muitos que também viveram a época de Mario Vianna, afirmam que nessas histórias sempre existem um pouco de exagero. Com exagero ou não, as histórias são realmente deliciosas.
Faleceu em 16 de Outubro de 1989.
.Revista Placar