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Na noite de 17 de dezembro de 1967, a Resenha Facit – a mais esperada e de maior audiência na época – havia se transferido de armas e bagagens da TV Rio, no velho Cassino Atlântico, em Copacabana, para a TV Globo, nos estúdios do Jardim Botânico. Os personagens, porém, eram os de sempre: Luiz Mendes, João Saldanha (foto), Armando Nogueira, José Maria Scassa, Nélson Rodrigues, Vitorino Vieira, Alain Fontain e Hans Henningsen – que Nélson Rodrigues apelidou de “O Marinheiro Sueco”.
O assunto só poderia ser um: a vitória do Botafogo por 2 a 1, à tarde, no Maracanã (gols de Roberto e Gérson), conquistando o título carioca (o Bangu tentava o bi). Lá pelas tantas, João Saldanha, com sua habitual franqueza, disse que o goleiro Manga tivera uma atuação suspeita, frase que Luiz Mendes, outro dia, me confirmou pelo telefone.
Minutos depois, Castor de Andrade, que morava ali perto – e garantem era tricolor – invadiu os estúdios da TV Globo portando um revólver de ouro maciço e ameaçando João Saldanha, que não se intimidou: jogou um pesado cinzeiro sobre Castor e, logo em seguida, um copo d´água. O clima ficou pesado. Pesadíssimo, por sinal. Formado o tumulto – sem tiros, por sorte – a resenha saiu do ar, Castor foi retirado do estúdio e tudo, aparentemente voltou ao normal, para espanto de Nélson Rodrigues, principalmente, que não entendeu rigorosamente nada do que acontecera. A Resenha Facit prosseguiu e terminou sem maiores conseqüências – felizmente para todos, integrantes e fiéis telespectadores.
Na quarta, dia 20, à noite, na sede do Mourisco Pasteur, houve um jantar de confraternização, presidido por Althemar Dutra de Castilho que acabara de derrotar Ney Cidade Palmeiro nas eleições do clube. Quando a festa já começara, João Saldanha, chegou acompanhado de Luiz Mendes e Bebeto de Freitas – atual presidente do Botafogo e parente de Saldanha. Nesse exato instante, Manga levantou-se da mesa e caminhou decidido em direção a Saldanha. João, que sempre andava armado, sacou seu revólver e deu dois tiros em Manga, que só não acertaram o alvo porque Bebeto e Mendes seguraram seu braço de maneira mais do que providencial. Um terceiro tiro ainda foi disparado a esmo.
Manga, dotado de um porte físico extraordinário, fugiu em disparada e pulou, de uma só vez, o muro que cercava o Mourisco e desapareceu na noite. Sandro Moreyra, sempre galhofeiro, garantiu que Manga, naquela noite, batera o recorde mundial do salto em altura, pois que os muros do Mourisco mediam cerca de três metros.
Mas toda essa história tem uma razão de ser. A 19 de setembro daquele ano, a então CBD teve a infeliz idéia de nomear Castor para chefiar uma delegação brasileira que foi enfrentar o Chile no Estádio Nacional. O Brasil, dirigido por Zagallo, venceu o Chile por 1 a 0, gol de Roberto, contando em seu time com vários jogadores do Botafogo, como Manga, Moreira, Zé Carlos, Leônidas, Gérson e Roberto, o autor do gol. Daí surgiram os boatos de que Castor teria aliciado Manga caso Botafogo e Bangu fossem para a final do campeonato, como tudo indicava.
O fato é que Manga teve, como Saldanha disse, uma atuação suspeita. Num determinado lance, ao saltar com Del Vecchio, do Bangu, o goleiro alvinegro socou a bola contra as próprias redes, quando o placar (que seria o final) já era de 2 a 1 para o Botafogo. O árbitro deu falta de Del Vecchio mas a partir desse momento, Gérson passou a jogar de líbero, entre Zé Carlos e Leônidas. Aí não passou mais nada. Gérson mandou Carlos Roberto jogar no meio-campo e ficou ali como uma espécie de cão de guarda de Manga.
Até hoje Gérson silencia sobre o assunto. Mas Manga foi embora do Botafogo em 1969 – dez anos depois de chegar de Pernambuco. Hoje, 40 anos depois, o mistério permanece. Manga estava ou não vendido a Castor de Andrade?
Roberto Porto
PS.: Eu estava na redação do Jornal do Brasil acompanhando pelo rádio os acontecimentos do Mourisco. A arma de João Saldanha foi estrategicamente parar, escondida, no bolso do paletó de Althemar Dutra de Castilho. E Saldanha deixou o Mourisco no Kharman Guia de Luiz Mendes.