Desbravador de estádios já pisou em mais de dois mil campos de futebol

Conheça Seu Lamas, um gaúcho aposentado cheio de histórias para contar

[img:seu_lamas_01.jpg,full,alinhar_esq_caixa] Começou por acaso. No estilo como quem não quer nada, Francisco de Paula Euzébio Lamas, ou Seu Lamas, se tornou um desbravador de estádios de futebol. Talvez o único no Brasil e até no mundo. Este gaúcho de 61 anos tem um passatempo inusitado: visitar os campos de várias partes do planeta para tirar fotos. Orgulhoso, ja fez as contas dos mais de 2.200 locais por onde passou.
Jogador profissional do Farroupilha de Pelotas, entre 64 e 68, o ex-meio-campista decidiu deixar as chuteiras de lado por questões econômicas. Se formou em eletrotécnica e percebeu que ganharia mais dinheiro com o novo ofício, mas sem deixar a paixão pelo esporte de lado.

– Não foi uma coisa pré-determinada ou programada. Sempre gostei de futebol. Quando parei de jogar, a cada viagem de passeio e de férias que fazia, eu fotografava os estádios de futebol, principalmente aqueles mais conhecidos. Posteriormente, tive a ideia de fotografar estádios menores também. Em todas as viagens eu registrava vários estádios. Por onde eu passava ia conhecer – disse.

Na coleção, tem imagens dos principais gramados do mundo. Conhece palcos de jogos de futebol da América do Sul, Europa e até nos Emirados Árabes. Em alguns, registra apenas uma foto. Em outros, faz duas ou três. Com isso, tem cerca de 7 mil guardadas em vários álbuns. Além delas, recorta figuras e informações de revistas que trazem detalhes de cada local.

– É um trabalho de pesquisa. Vou pesquisando em revistas, jornais, internet, televisão e vou programando para a viagem. Onde tem estádio de futebol, eu programo chegar lá e tirar a fotografia. Quando eu saio para a viagem, tenho a programação de quais estádios vou conhecer, os locais que vou visitar e dentro do período disponível – explicou.

Assim como deixar o futebol ocorreu de forma natural, a coleção cresceu aos poucos. Tanto que ele sequer imaginava ir tão longe quando tudo começou, na década de 70.

– Eu não tinha nem ideia disso. Comecei aos poucos e fui conhecendo. Não tenho nem noção de até quando eu vou fazer isso. Não me preocupa. Eu também não quero apenas conhecer os estádios. Eu aproveito a viagem para ver os pontos turísticos das cidades – contou.

Missões (quase) impossíveis

[img:seu_lamas_02.jpg,full,alinhar_esq_caixa] Estádio do Manchester United, Inglaterra

Seu Lamas não tem um time de coração. Conseguiu fugir até da rivalidade que existe no Rio Grande do Sul. Grêmio ou Inter? Nenhum (ou os dois). É sócio de ambos, vai a todos os jogos da Dupla e também prestigia os pequenos. Na infância, era são-paulino, em São Paulo, e americano, no Rio. Na coleção de fotos, poucas vezes aparece em estádios cheios ou com bola rolando. A finalidade é fotografar e não assistir aos jogos. Mas a missão nem sempre é tranquila, especialmente no Brasil.

– Na Europa é bem fácil. O pessoal tem prazer em mostrar os estádios e facilita bastante. Mas em alguns lugares aqui na América do Sul, principalmente, a gente tem alguma dificuldade. No Brasil, tive dificuldade de conhecer o estádio da Portuguesa, do Palmeiras, do Botafogo. São locais onde eu tive que ir três ou quatro vezes para poder tirar uma foto. Nos centros de treinamento do São Paulo e do Palmeiras eu fui cinco ou seis vezes. Na Argentina, fui três vezes ao estádio do River Plate (Monumental de Nuñez) e não consegui entrar. Tive que ir uma quarta vez e aí sim marcar a visita para conhecer. Se as coisas são bonitas, por que não mostrar? Seria interessante que eles mostrassem para que a gente pudesse divulgar, falar para os colegas como é o estádio. Mas não é bem assim – reclamou.

Nada que resista à persistência deste aposentado. Qualquer ajuda é bem-vinda, mas se ele não vir o campo com os próprios olhos…

– Eu tenho essa preocupação de conhecer e de uma hora para outra vou lá e terminou. É uma figurinha que está faltando no álbum. Quando consegue, fechou. Para conhecer o estádio do River, tive que ficar um dia a mais em Buenos Aires e esperar o dia de visitação. Como eu estive lá três vezes, falei com um amigo que não tinha conseguido, ele passou de avião sobre o estádio, tirou uma foto e me mandou. Mas eu tinha que ir até lá. Tenho a foto dele no álbum como lembrança, mesmo depois de ter conseguido fotografar – afirmou.

[img:seu_lamas_03.jpg,full,alinhar_esq_caixa] Casa do Chelsea também foi visitada

Seu Lamas conhece praticamente todos os estádios da Espanha, Portugal, Itália, País de Gales, Suíça, Inglaterra e Emirados Árabes. Recentemente, fez uma viagem para conhecer os da América do Sul: Chile, Paraguai, Equador, Peru e Bolívia estavam no roteiro. Achou muito? Ele quer mais.

– Na Espanha, só não conheço o de Tenerife, que é uma ilha. Eu pretendo um dia chegar. Em Portugal falta os da Ilha da Madeira. Quero fazer uma viagem que eu passe por lá. Na Inglaterra conheço todos da primeira, segunda, terceira, quarta e quinta divisões. Alguns da sexta, sétima e oitava. Visitei os estádios de todo o Sul da França. Faltam alguns do Norte. Na Holanda, conheço o do Ajax e pretendo conhecer os demais. Na Alemanha, visitei a parte Sul. E por aí vai. Na América do Sul, faltam Colômbia e Venezuela – relatou.

A ideia é completar os estádios da França e aproveitar para conhecer Luxemburgo, alguns estádios da Bélgica, Holanda e o Norte da Alemanha. Existe a meta de terminar a América do Sul e a partir disso ele vai decidir o que fazer. Enquanto não chega, Seu Lamas aponta o palco que mais chamou sua atenção. Se é que consegue lembrar de todos.

– É difícil apontar um porque são muitos estádios bonitos. Mas eu cito o Millennium Stadium, em Cardiff, no País de Gales. É um estádio interessante porque ele fecha a parte superior em dia de chuva. É um que chama a atenção, mas conheci vários muito bonitos – lembrou.

Tecnologia, improviso e muita história

[img:seu_lamas_04.jpg,full,alinhar_esq_caixa] O viajante tem todos os estádios catalogados

Seu Lamas tem tantas fotos que várias são repetidas. Muito por culpa das antigas máquinas fotográficas analógicas. Sorte que a tecnologia avançou. Além do tempo, ele poupa dinheiro.

– Agora é muito mais fácil. Inicialmente, batia quatro ou cinco fotos do estádio e não sabia se as fotos ficariam boas. Tenho muitas que sobraram e várias vezes retornei a estádios distantes. Com a máquina digital, você bate e na hora verifica a qualidade. É muito mais fácil de controlar também a quantidade das fotos. Fotografo muito em uma viagem – comentou.

Conhecer tantos países exige, no mínimo, o domínio do inglês. Algo que o viajante não tem. Mas se engana quem pensa que isso é um obstáculo. Muito pelo contrário.

– Eu uso o “Ítaloportunolis”. É a soma do inglês, espanhol, português e italiano. Tudo falado ao mesmo tempo. Não pode ser separado. Mistura tudo e o pessoal entende (risos). Sempre consigo me comunicar, sem dificuldade nenhuma – contou.

Mas quem não se enrola com as palavras muitas vezes teve que se livrar de apuros. No início da aventura, Seu Lamas tinha a companhia da mulher, a simpática Dona Maria, e dos filhos. Com o tempo, passou a ser um “rato de estádios” solitário. Ele guarda histórias curiosas que viveu com a família.

– Minha mulher esteve comigo na Inglaterra, na Escócia, na França. A idade vai passando, vai cansando, ela também tem outras preocupações, tem a saudade do neto, e não me acompanha tanto mais. Eu continuo no meu caminho e passo por algumas situações. Em uma delas, ainda com a minha esposa, o estádio, que ficava na divisa de Mato Grosso com Goiás, estava fechado e eu pulei o muro. Abri um portão para que ela entrasse e logo que entrou tinha uns quinze cachorros que vieram na nossa direção. A sorte é que tinha um outro portão de acesso ao estádio. Entramos, fechamos e aguardamos que eles se acalmassem para a gente poder sair. Foram se afastando, e nós saímos sem problema nenhum – destacou.

Um risco que dá prazer e, acima de tudo, enriquece quem tem paixão pelo esporte e pela vida.

– Isso tudo é história. A gente vive de história. Quem não tem algo para contar não viveu. Temos recordações desde quando as crianças eram pequenas. Bati uma foto do meu guri que tive que encostar ele em uma das traves do Castelão, em Fortaleza. Ele não conseguia nem ficar em pé. A gente tem as lembranças desse tempo que eles acompanhavam. Hoje são adultos. Eu não tenho uma meta de chegar a um número de estádios. Eu tenho duas programações feitas. Se realizar, ótimo. Se não conseguir, não tem problema. Se der para fazer, talvez eu passe para uma terceira – ensinou.

Quem de nós não gostaria de ter um “álbum de figurinhas” assim???

Fonte: Globo Esporte.com

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