Copa do Mundo 1954 – A “Batalha de Berna” e a Hungria, uma máquina de jogar futebol

O BRASIL EM 1954

Mesmo passados quatro anos, o Brasil esportivo, em 1954, não havia esquecido o desastroso “maracanazzo” que acabou glorificando Gighia e condenando Bigode e Barbosa e, num nível mais brando, os demais jogadores brasileiros pela derrota para o Uruguai na Copa do Mundo de 1950, em pleno Maracanã.

Sempre foi muito comum, até os idos de 1970, a seleção brasileira ser formada com maioria absoluta de times que, na época da convocação estavam em boa fase, praticando o melhor futebol. Foi assim na Copa de 1930, com o Fluminense de Preguinho, Fernando Giudiceli, Veloso, Fortes e Ivan Mariz, embora, entre os titulares figurassem apenas Fernando Giudicili e Preguinho. Em 1950, com Barbosa, Eli, Maneca, Ademir Menezes, Danilo Alvim, Pinga. Em 1958 com Joel, Moacir, Dida, Gerson, Zagalo do Flamengo e Garrincha, Didi, Nilton Santos do Botafogo e em 1970 com Santos e Botafogo fornecendo quase todo o time titular.

Pois, em 1954 – claro que por conta do fracasso de 1950 – o Brasil mudou. Saiu Flávio Costa e entrou Zezé Moreyra no comando. Saiu Barbosa e entrou Castilho e outros que não haviam participado da derrocada de 50 assumiram a titularidade.

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Brasil no mundial da Suiça – Time que empatou com a Iugoslávia em 1×1. Em pé: Djalma Santos. Brandãozinho. Nilton Santos. Pinheiro. Mario Americo. Castilho e Bauer. Agachados: Julinho. Didi. Baltazar. Pinga e Rodrigues. Foto: Placar

Apesar do fraco desempenho da seleção brasileira no Campeonato Sul-Americano de 1953, realizado em Lima, capital do Peru, que perdeu para o Paraguai e ficou em segundo lugar, e ainda sem ter conseguido superar o trauma da derrota para os uruguaios em 1950, a participação do Brasil na Copa do Mundo de 1954 era esperada com certa ansiedade pelos torcedores brasileiros, que torciam para que a renovação iniciada pelo técnico, Zezé Moreyra, fosse o caminho mais curto para alcançar o título de campeão mundial de futebol, o sonho maior da população. A bem da verdade, time o Brasil tinha: no sistema defensivo, Djalma Santos, Pinheiro e Nilton Santos eram jogadores de alta categoria, tecnicamente superiores aos da malfadada Copa de 50. O time ainda contava com Bauer, Didi, em grande forma e Rodrigues.

Os brasileiros ficaram mais otimistas quando, nos meses de fevereiro e março, iniciando a campanha o Brasil, nas eliminatórias, se classificou invicto, mas com certa dificuldade, derrotando o Chile (2 x 0, em Santiago, com gols de Baltazar, e 1 x 0, no Maracanã, também com gol de Baltazar) e o mesmo Paraguai (1 x 0, em Assunção, com gol de Baltazar, e 4 x 1, no Maracanã, com gols de Julinho (2), Baltazar e Maurinho).

A vitória sobre o Paraguai em Assunção foi tão dramática que, quando aconteceu o jogo de volta no Brasil, uma massa de torcedores (176.000), a maior desde o fatídico dia 16 de julho de 1950, lotou o Maracanã para incentivar o time nacional, acreditando a partir daí, que a conquista do título mundial não era um sonho tão distante assim.

No dia 25 de maio de 1954, após as dispensas de Osvaldo Baliza, Salvador e Gerson dos Santos, a seleção brasileira embarcou para a Suíça, onde iniciou a fase final de treinamentos, realizando alguns amistosos contra times amadores. Era a volta da Copa do Mundo à Europa, dezesseis anos depois, intervalo em que o certame fora realizado – somente em 1950 – devido a segunda guerra mundial.

A BATALHA DE BERNA

Após garantir ótimos resultados nas fases anteriores, chegara, finalmente, o dia do selecionado brasileiro enfrentar a poderosa seleção húngara, campeã olímpica de 1952, jogando em estilo militarizado, invicta há mais de um ano, e com um sistema de jogo considerado inédito e revolucionário, com os jogadores entrando em campo sem posição fixa.

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Antes do jogo, Bauer capitão do Brasil e Boszìk da Hungria se cumprimentam. A hungria venceu o Brasil por 4×2.

Em que pese o alerta da imprensa brasileira para o poderio da “máquina húngara”, uma das melhores seleções de futebol de todos os tempos, com jogadores como Puskas, Kocsis e Boszik, jogadores e Comissão Técnica da seleção brasileira não deram muita trela. Mas, como levar a sério uma seleção que nunca vencera o Brasil, apesar das inquestionáveis vitórias na primeira fase, goleando a seleção da Coréia do Sul por 9 a 0 e a poderosa Alemanha pela esmagadora vitória de 8 a 3, numa demonstração de força e vigor?

Para o jogo diante da seleção brasileira, a seleção húngara não contou com seu melhor jogador, Puskas, que havia se contundido na partida anterior, contra a Alemanha, o que acabou animando os jogadores brasileiros, que acreditavam que, mais uma vez, a vitória era coisa certa. Estavam enganados.

Como existem coisas que só acontecem ao Botafogo, naquela época aconteciam coisas estranhas no Brasil. Quando o Brasil se preparava para acompanhar a narração do jogo, aconteceu um defeito nas transmissões, exatamente quando a partida começou. Felizmente ou infelizmente, cerca de 10 minutos depois, quando foi restabelecida a transmissão, uma nação assombrada foi informada de que o Brasil já perdia por 2 a 0, gols de Hidegkuti e Kocsis. Aos 18, entretanto, o selecionado brasileiro diminuiria o placar, graças a um gol de pênalti convertido por Djalma Santos, estabelecendo 2 a 1. O placar ficou assim até o final do primeiro tempo.

O selecionado brasileiro retornou com tudo para o segundo tempo, imprimindo mais velocidade no jogo, passando a dominar as ações. E, quando tudo levava a crer que o gol brasileiro era uma questão de tempo, o juiz inglês, Arthur Ellis, que no primeiro tempo marcara um pênalti a favor do Brasil (convertido por Djalma Santos), pegou um toque de Pinheiro dentro da área brasileira. Era outro pênalti, agora em favor dos húngaros, convertido por Lantós, parecendo colocar uma pá de cal na esperança brasileira.

Correndo contra o tempo, o time de Zezé Moreyra saiu desesperado para o ataque, até que Julinho, driblando todo o time húngaro, marca o segundo gol para o Brasil, fazendo renascer as esperanças da torcida brasileira. Eis que, exatamente quando o time brasileiro precisava somar todas as forças, Nilton Santos, troca pontapés com o melhor jogador da Hungria em campo, Boszik. Os dois foram expulsos, com o selecionado brasileiro perdendo muito mais. Eram exatos 42 minutos do segundo tempo quando a Hungria fez outro gol, fechando o placar em 4 a 2. O selecionado brasileiro ainda perdeu outro jogador expulso: Humberto Tozzi, por jogo violento sem bola, contra o artilheiro Kocsis. Era a eliminação.

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Húngaros vibram com vitória na “Batalha de Berna”

Quando o árbitro inglês encerrou a partida, começou uma confusão sem tamanho. Completamente descontrolado, Pinheiro deu uma garrafada na cabeça do craque Puskas que estava no banco dos reservas, mas levando outra no supercílio direito. Aí, aconteceu uma briga generalizada, todo mundo brigando contra todo mundo. No caminho dos vestiários, Zezé Moreyra acertou com uma chuteira o rosto do cartola adversário, o vice-ministro Gustavo Sebes, enquanto o então árbitro Mário Viana, forte como um touro, também entra na confusão, chamando Ellis de ladrão, sendo mais tarde, desligado da FIFA.

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FICHA TÉCNICA
Jogo: Brasil 2 x 4 Hungria;
Local; Estádio Wankdorf, em Berna, na Suíça;
Árbitro: Arthur Edward Ellis, da Inglaterra;
Gols: 1 x 0 – Hidegkuti, aos 4; 2 x 0 – Kocsis, aos 7; 2 x 1 – Djalma Santos, aos 18, de Pênalti; 3 x 1 – Lántós, aos 53, de pênalti; 3 x 2 – Julinho, aos 65; 4 x 2 – Kocsis, aos 88.
[img:20px_Flag_of_Brazil.svg_1_.png,full,alinhar_esq_caixa] BRASIL: Castilho; Djalma Santos, Pinheiro, Nilton Santos e Bauer; Brandãozinho, Didi e Humberto Tozzi; Maurinho, Índio e Julinho. Técnico: Zezé Moreyra;

[img:hungria.jpg,full,alinhar_esq_caixa] HUNGRIA: Grosics; Buzánszky e Lántós; Bozsik, Loránt e Zakárias; Tóth e Kocsis; Hidegkuti, Czibor e József Tóth. Técnico: Gyula Mandi.

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MAIS UMA VEZ O MELHOR NÃO VENCEU!!!

A poderosa “máquina húngara” faria mais uma vítima, goleando o selecionado do Uruguai por 4 a 2 nas semifinais, entrando favorita para a final contra a Alemanha, a quem tinha batido por 8 x 3 na primeira fase. Debaixo de muita chuva, logo no início da partida, os húngaros já ganhavam de dois a zero, tudo levando a crer que a história se repetiria contra os alemães.

Outra grande injustiça – Uma seleção habilidosa, que massacrou os adversários na fase inicial da competição, perdeu a Copa para um time limitado, mas guerreiro. Quatro anos depois do fracasso da seleção brasileira no Maracanã, a história se repetiu. Dessa vez, o “futebol-arte” da Hungria sucumbiu à força da Alemanha Ocidental.

A Copa de 1954 foi a primeira realizada na Europa desde 1938. E escolha da Suíça como sede obedeceu a razões políticas, uma vez que o país se manteve neutro durante a Segunda Guerra Mundial. A principal característica dessa Copa foi a bola na rede. Nada menos do que 140 gols foram marcados em 26 jogos (média de 5,4 por jogo, a maior até hoje).

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Mundial 1954 : Alemanha 3 x 2 Hungria. O dia que Alemanha parou “a Máquina”…

A Hungria, segunda colocada em 1938, era a franca favorita ao título. Campeã olímpica dois anos antes, a equipe estava invicta há 27 jogos até o início do torneio e contava com uma constelação de craques como Puskas, Kocsis e Czibor. Entretanto, na decisão, a Alemanha neutralizou o poder ofensivo húngaro e venceu a partida por 3 a 2, de virada. O resultado é considerado até hoje uma das maiores injustiças da história do futebol. Depois desse jogo, os húngaros nunca mais conseguiram formar uma seleção competitiva e fazer uma boa campanha. A história se repetia. Como em 1950, a equipe favorita perdia o título mundial, deixando, porém, para a posteridade, a imagem de uma das mais impressionantes seleções de futebol que o mundo esportivo já conheceu.

OS MÁGICOS MAGIARES

A Hungria desembarcou naquele Mundial com absoluto favoritismo. Vinha de ter conquistado a medalha de ouro nas Olimpíadas de 1952, em Helsinque, e estava invicta há quase cinco anos. Comandada por Puskas, estava fadada a fazer história na Copa. E fez, só que às avessas. Depois de massacrarem cada um de seus adversários – inclua-se aí o Brasil -, os húngaros, ou os mágicos magiares, acabaram esbarrando na força alemã e perderam por 3 x 2, em uma das maiores “zebras” da história dos Mundiais. Após a Copa, o “time de ouro”, como ficou conhecida aquela Seleção Húngara, se manteve mais um ano e meio invicto, vindo a perder novamente só no início de 1956.

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Hungria 1954 : Grosics; Buzansky e Lantos; Bozsik, Lorant e Zakarias; Czibor, Kocsis, Hidegkuti, Puskas e Toth I. Técnico: Gusztav Sebes

Gusztav Sebes
O húngaro Gusztav Sebes foi o precursor do carrossel e da tese de que o jogador precisava ser multifuncional. No esquema tático da Hungria, havia uma rotatividade intensa dos jogadores de meio-campo e ataque, o que foi uma revolução para a época. O time envolvia o adversário. Para atingir a meta de correr o campo todo, a Hungria foi a primeira seleção a investir forte na preparação física. Gusztav Sebes tornou célebre uma frase: “Futebol é cabeça e pulmões”. Por essa determinação, a Hungria foi também a primeira seleção a fazer aquecimento antes dos jogos. Adotaram o 4-2-4, a príncipio, como alternativa defensiva ao comum esquema com 5 atacantes. Hoje em dia é considerada uma formação ofensiva.

O cérebro do time
[img:puskas_1_2.jpg,full,alinhar_esq_caixa] “Os adversários podem jogar melhor, mas a bola é redonda para todos.” O autor desta frase é Ferenc Puskas, o grande nome da Seleção Húngara de 1954. Quando disputou o Mundial, ele caminhava para ser um jogador veterano. Aos 27 anos, porém, já era um craque consagrado na Europa. No Mundial, Puskas jogou no sacrifício. Ficou de fora de duas partidas – entre elas, a “batalha de Berna”, como ficou conhecido o duelo contra o Brasil – e atuou sem condições na final contra a Alemanha. Sua presença no time, no entanto, era fundamental. Puskas não era apenas o cérebro, mas a alma do “time de ouro”.

Fontes:
www.jornalpequeno.com.br
www.sunrisemusics.com

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