Arquivo do Autor: Antonio Napoleao

O BRASIL NA COPA DO MUNDO DE 1934

No início de 1934, já prevendo o que poderia acontecer, a imprensa do Rio e de São Paulo procurou se empenhar numa campanha para que a briga entre as entidades de regime de futebol amador e profissional do Rio e São Paulo não prejudicasse a participação da Seleção Brasileira na Copa do Mundo.

Eduardo Trindade, presidente da Amea, sugeriu a adoção de um regime misto, previsto nos estatutos da Confederação Brasileira de Desportos, com o objetivo de se chegar a um acordo. No entanto, a Liga Paulista de Futebol e a Liga Carioca de Futebol negaram ceder seus jogadores à CBD. Com a negativa, coube a Carlos Martins da Rocha, o “Carlito Rocha”, dirigente do Botafogo, a tarefa de montar a Seleção.

Carlito Rocha era profundo conhecedor de futebol. Experiente, sabia que iria necessitar de uma equipe forte para a disputa do torneio. O primeiro passo foi acertar com o técnico, Luis Vinhais, vencedor de duas edições da Copa Rio Branco. Em seguida, partiu em busca dos profissionais, uma atitude considerada leviana, pois como poderia um defensor ferrenho do amadorismo contratar atletas profissionais? Mas, na verdade, ele tinha conhecimento de que só com amadores não chegaria a lugar algum. Na capital paulista, contratou quatro jogadores da equipe do São Paulo. Após uma partida contra a Portuguesa de Desportos, Sylvio Hoffmann, Luizinho, Waldemar de Britto e Armandinho embarcaram às escondidas para o Rio de Janeiro. No Rio Grande do Sul, acertou com Luiz Luz e Patesko. No Rio de Janeiro, o único clube prejudicado foi o Vasco da Gama: perdeu Tinoco e Leônidas da Silva. Corria o boato de que a CBD havia assinado contrato com estes atletas pagando 30 contos de luvas e ordenado de 1 conto de réis. Esta atitude levou o “Jornal dos Sports” a estampar, em sua primeira página, a seguinte manchete: “Patriotismo por 30 contos”. Pouco adiantou todo o esforço. A Seleção Brasileira partiu para disputar a sua segunda Copa do Mundo sem qualquer planejamento, numa viagem cansativa, de doze dias de duração, a bordo do navio “Conte de Biancamano”.

Os treinos visando à preparação física do grupo, como em 1930, eram realizados no convés do navio. As únicas exceções ocorreram quando o navio aportou em Barcelona, para o embarque dos espanhóis, nossos adversários. Os jogadores fizeram um pequeno treino recreativo de aproximadamente, quarenta minutos e, posteriormente, um único treino num campo de dimensões reduzidas próximo ao Estádio Luigi Ferraris. Muito pouco para quem enfrentaria uma das melhores seleções da Europa em sistema eliminatório.

Não deu outra, a Espanha venceu por 3 a 1. Os espanhóis começaram o jogo muito concentrados e com menos de 30 minutos, já venciam por 3 a 0. Iraragorri fez 1 a 0, em cobrança de pênalti. Oito minutos depois, Lángara marcou o segundo, pouco mais de três minutos haviam se passado e o próprio Lángara marcou o terceiro gol espanhol. No segundo tempo, o Brasil melhorou. Leônidas pegou um rebote do goleiro Zamora e descontou aos 55. Mesmo assim tivemos a chance de até empatar o jogo. Aos 59 minutos, Luizinho teve um gol mal anulado pelo árbitro, que marcou impedimento. Aos 62 minutos, pênalti a favor do Brasil. Waldemar de Britto bateu e Zamora defendeu.

Mas foi uma partida repleta de erros do árbitro alemão Alfred Birlen. Os brasileiros saíram reclamando de um pênalti não marcado contra a Espanha, quando zagueiro Quincoces tirou a bola com a mão em cima da linha de gol, Leônidas chutou, Zamora ficou batido e o zagueiro cometeu o pênalti. Reclamações à parte a Espanha venceu por 3 a 1. O Brasil estava novamente fora da Copa. A campeã foi à Itália, que venceu a Tchecoslováquia na final por 2 a 1.

FICHA DO JOGO

27 de maio de 1934 (16:30)

ESPANHA 3:1 BRASIL (3:0)

Local: Estádio Luigi Ferraris, em Genoa.

Público: 16500 espectadores.

ESPANHA: Zamora (Madrid FC); Ciriaco (Madrid FC) e Quincoces (Madrid FC); Cilauren (Athletic C. Bilbao), Muguerza (Athletic C. Bilbao) e Márculeta (Dinostia FC); Iraragorri (Athletic C. Bilbao), Lángara (Oviedo FC), Lecue (Real Betis BS), Lafuente (Athletic C. Bilbao) e Gorostiza (Athletic C. Bilbao).

Técnico: Amadeo García Salazar.

BRASIL: Pedrosa (Botafogo FC-RJ); Sylvio Hoffman (CBD) e Luiz Luz (CBD); Tinoco (CBD), Martim (Botafogo FC-RJ) e Canalli (Botafogo FC-RJ); Luizinho (CBD), Waldemar de Britto (CBD), Leônidas (CBD), Armandinho (CBD) e Patesko (CBD).

Técnico: Luis Augusto Vinhaes.

Gols: 1:0 Iraragori (pênalti), aos 18; 2:0 Lángara, aos 25; 3:0 Lángara, aos 29; 3:1 Leônidas, aos 55.

Árbitro: Alfred Birlem (Alemanha).

Assistentes: Ettori Carminati (Itália), Mihaly Ivanicsic (Hungria).

DELEGAÇÃO DO BRASIL

APELIDO
NOME COMPLETO
POS
NASCIMENTO
MORTE
CLUBE

ARIEL
Ariel Augusto Nogueira
M
22/02/1910 (Petrópolis)
não disponível
Botafogo FC-RJ

ARMANDINHO
Armando dos Santos
A
03/06/1911 (São Carlos)
26/05/1972 (São Paulo)
CBD

ÁTILLA
Attila de Carvalho
A
16/12/1910 (Rio de Janeiro)
não disponível
Botafogo FC-RJ

CANALLI
Heitor Canalli
M
31/03/1910 (Juiz de Fora)
21/07/1990 (Juiz de Fora)
Botafogo FC-RJ

CARVALHO LEITE
Carlos Aantonio Dobbert de Carvalho Leite
A
25/05/1912 (Rio de Janeiro)
19/05/2004 (Rio de Janeiro)
Botafogo FC-RJ

GERMANO
Germano Boetcher Sobrinho
G
14/03/1911 (Rio de Janeiro)
09/06/1977 (Rio de Janeiro)
Botafogo FC-RJ

LEÔNIDAS DA SILVA
Leonidas da Silva
A
06/09/1913 (Rio de Janeiro)
24/01/2004 (São Paulo)
CBD

LUISINHO
Luis Mesquita de Oliveira
A
29/03/1911(Rio de Janeiro)
27/12/1983 (São Paulo)
CBD

LUIZ LUZ
Luiz dos Santos Luz
D
26/01/1909 (Porto Alegre)
27/08/1989 (Porto Alegre)
CBD

MARTIM
Martim Mercio da Silveira
M
02/03/1911 (Bagé)
16/08/1972 (Rio de Janeiro)
Botafogo FC-RJ

OCTACÍLIO
Octacilio Pinheiro Guerra
D
21/11/1909 (Porto Alegre)
26/02/1967 (Porto Alegre)
Botafogo FC-RJ

PATESKO
Rodolpho Barteczko
A
12/11/1910 (Curitiba)
13/03/1988 (Rio de Janeiro)
CBD

PEDROSA
Roberto Gomes Pedrosa
G
08/07/1913 (Rio de Janeiro)
06/01/1954 (São Paulo)
Botafogo FC-RJ

SYLVIO HOFFMANN
Sylvio Hoffmann Mazzi
D
11/05/1908 (Rio de Janeiro)
15/11/1991 (Rio de Janeiro)
CBD

TINOCO
Alfredo Alves Tinoco
M
02/12/1904 (Rio de Janeiro)
04/07/1975 (Rio de Janeiro)
CBD

WALDYR
Waldyr Guimarães
M
21/03/1912 (Rio de Janeiro)
1997 (Rio de Janeiro)
Botafogo FC-RJ

WALDEMAR DE BRITTO
Waldemar de Britto
A
17/03/1913 (São Paulo)
21/12/1979 (São Paulo)
CBD

TÉCNICO

LUÍS VINHAES

(Luís Augusto Vinhaes. Nascimento: 11/03/1896, Rio de Janeiro. Morte: 04/04/1960, Rio de Janeiro).

UNIFORME DO BRASIL
Uniforme_Brasil_1934

A PRIMEIRA COPA ROCA (1914)

Um mês depois a Seleção Brasileira parte para disputar sua primeira competição no exterior, a Copa Roca. A taça foi uma doação do general Julio Roca, ministro das Relações Exteriores da Argentina, que tinha excelentes relações com o Brasil. A doação tinha como objetivo fortalecer a cordialidade esportiva entre os dois países. Antes do jogo válido pela disputa da Copa Rocca, o Brasil realizou o seu primeiro amistoso internacional contra a própria Argentina, sendo derrotado por 3 a 0.

No dia 27 de setembro de 1914, a Seleção Brasileira entrava no campo do Gymnasia Y Esgrima para disputar sua primeira partida oficial numa competição contra uma federação estrangeira. Os argentinos, mais experientes em jogos internacionais, que uma semana antes haviam vencido um amistoso por 3 a 0, davam como certa a vitória. Acontece, que na partida amistosa não havia participado um baixinho chamado Rubens Salles. Foi exatamente ele o autor do gol que nos deu a primeira vitória numa competição, e por conseqüência, o primeiro título internacional.

O gol aconteceu logo aos 13 minutos do primeiro tempo. Rubens Salles deu chute indefensável de fora da área: a bola subiu, pegou efeito e descaiu; o goleiro Rithner nem viu por onde passou. Nesta partida também aconteceu um fato que entrou para a história dos confrontos entre Brasil e Argentina. Aos 21 minutos do segundo tempo, o atacante Roberto Leonardi, que era estudante de medicina recebeu um lançamento de Izaguirre, dominou no peito, deu um sem-pulo e empatou a partida. O árbitro, que foi o brasileiro Alberto Borghert, validou o gol normalmente. Antes que os brasileiros dessem a saída, Leonardi se dirigiu ao árbitro, dizendo: “Não valide o gol, senhor Juiz, porque ajeitei a bola com a mão e não no peito”. Borghert apertou a mão do jogador argentino pela honesta atitude e ordenou a cobrança do tiro de meta. Após a partida, o embaixador brasileiro em Buenos Aires, Sérgio Dantas, fez o seguinte comentário: “O gesto foi tão sublime que o gol deveria valer por dois”. Nos dias de hoje, não só por conta da rivalidade dos dois países no futebol, seria impossível presenciar tal ato de honestidade. No retorno dos campeões, o Cais do Porto, no Rio de Janeiro, tornou-se pequeno para a grande quantidade de torcedores que foram recepcionar os craques da seleção.

BRASIL 1 x 0 ARGENTINA

Data: 27 de setembro de 1914.

Competição: Copa Roca.

Local: Estádio do Club Gimnasia y Esgrima, em Buenos Aires (Argentina).

Público: 17.200 pagantes.

Árbitro: Alberto Borgerth (Brasil).

Gols: Rubens Salles aos 13.

BRASIL: Marcos de Mendonça (Fluminense FC-RJ), Píndaro (CR Flamengo-RJ) e Nery (CR Flamengo-RJ); Lagreca (AA São Bento-SP), Rubens Salles (CA Paulistano-SP) e Pernambuco (Fluminense FC-RJ); Millon (CA Paulistano-SP), Oswaldo Gomes (Fluminense FC-RJ), Friedenreich (CA Ypiranga-SP), Barthô (Fluminense FC-RJ) e Arnaldo (CA Paulistano-SP).

Ground Committeé: Sylvio Lagreca e Rubens Salles (capitão).

ARGENTINA: Rithner (CA Porteño); Bernasconi (C Estudientes de La Plata) e Lanús (C Estudientes de La Plata); Naón (Gimnasia y Esgrima), Sande (C Estudientes de La Plata) e Sayanes (Ferro Carril Oeste); Lamas (C Estudientes de La Plata), Leonardi (C Estudientes de La Plata), Piaggio (C Atlanta), Izaguirre (S Palermo) e Crespo (CA Tigres).

Técnico: Juan José Rithner (capitão).